21.11.17

Capítulo 53 - Parte 1/2

   - Mamãe? Por favor, não vai embora. Eu preciso de você. – A fala estava tão embolada por conta do choro. Se Dianna receberia o recado, era outra história. As mensagens não chegavam, o celular deveria estar desligado, por isso não recebia ligações. Se tudo que estava escrito naquela carta fosse realmente verdade, Demi tinha a perdoado. Aliás, não tinha como ser mentira, os fatos se encaixavam perfeitamente.

Não tinha como mudar o passado e nem esquecer os momentos ruins que tinha vivido por culpa de Dianna. Porém existia a possibilidade de juntas, construírem um presente e futuro diferente onde poderiam finalmente assumir os papeis de mãe e filha sem mágoas ou ressentimentos.

A cabeça de Demi doeu insuportavelmente, ela se sentou ao sofá discando mais uma vez o número do celular da mãe. Estava desligado. O sentimento era sufocante, pois ela tinha medo de perder Dianna para sempre. Não tinha como enganar a si mesma. Dianna sempre a deixaria sem jeito e de coração acelerado. Enquanto estava acomodada no apartamento ali em Manhattan, Demi tinha a segurança de poder ignora-la porque sabia que ela sempre estaria ali vivendo a mesma vida, mas fora do pais? Como funcionaria? Não tinha como saber se Dianna estava bem e se precisava de ajuda com as despesas da casa.

   - Eu juro que entendo tudo que você passou. – Disse mais calma ao celular gravando uma mensagem de voz que tinha a esperança que Dianna fosse ouvir. – Eu estou magoada com você, sempre estive. Mas eu te amo e tenho fé que nós duas podemos superar o nosso passado, eu não posso viver sem você. Quando você estava aqui no apartamento da vovó, mesmo chateada eu sabia que você estava bem e segura, que eu poderia te ver na hora que eu quisesse. O que vou fazer com você longe? Eu estou te dando mais uma chance para você ser a minha mãe, não vá embora. Por favor. – As botas foram calçadas de qualquer jeito, Demi guardou o celular dentro da bolsa, respirou fundo de olhos fechados cobrindo o rosto com as mãos e se levantou determinada. Estava nevando, o que significava que existia uma grande possibilidade de os voos atrasarem, e se ela tivesse sorte e fosse rápida, poderia impedir a mãe de sumir no mapa a deixando com o coração despedaçado mais uma vez.

As mãos estavam tremulas que o copo com água quase foi ao chão. Demi limpou as lágrimas tentando se controlar e se preparou para sair do apartamento às pressas, a bolsa estava no ombro e ela tentava pegar o celular e a chave.

   - Selena? – Demi engoliu em seco quando Selena a abraçou. Ela mal tinha aberto a porta e como não sabia o que dizer, abraçou Selena de volta procurando nela forças para não desabar em choro.

   - Eu preciso de você, Dem. Preciso muito. – Murmurou Selena descansando a cabeça no ombro de Demi. – Eu sinto tanta a sua falta. – O plano era não deixar mais lágrimas rolarem, porém Demi falhou.

   - Eu também sinto a sua. – Demi apertou mais o abraço aproveitando para sentir o cheiro do cabelo da amiga e como as mechas expostas estavam geladas.

   - Ei, você estava chorando? – Selena perguntou quando elas romperam o abraço e se olharam nos olhos. Ainda rolavam algumas lágrimas dos olhos de Demi, mas estava evidente que a ponta do nariz vermelha e os olhos irritados não era de agora.

   - É uma longa história. – Demi forçou um sorriso porque estava feliz por Selena estar ali com ela. – Eu tenho que ir ao aeroporto agora. A minha mãe está indo embora e... eu preciso impedi-la.

   - Indo embora? Para onde? Dem, você não vai trancar a porta? – Disse Selena quando Demi começou a caminhar apressadamente a segurando pela mão pelo corredor. – Eu estou confusa.

   - Você pode me levar ao aeroporto? – Perguntou apressadamente trancando a porta do apartamento e quando Selena assentiu, Demi envolveu os dedos aos dela e a puxou para que caminhassem na direção do elevador.

   - Você pode me explicar o que está acontecendo? – Bem, Demi estava nervosa, ansiosa e aflita acomodada ao banco do carona. Os dedos ainda estavam enlaçados aos de Selena sobre a marcha do carro e o lábio inferior era mordido com força. – Ei, para de tremer a perna. – Pediu observando que Demi estava ansiosa a ponto de tremer a perna esquerda incansavelmente.

   - Minha mãe deixou uma carta contando que está indo embora para o Reino Unido e explicando tudo que ela passou. – Comentou se sentindo ainda mais ansiosa. – Eu não posso deixa-la ir. Preciso dela aqui comigo, Sel.

   - Dem... – Se tratando de Dianna, o receio sempre estaria estampado no rosto de Selena, ela não podia evita-lo porque desde que a conhecia, sabia que a mulher era uma caixinha de surpresas. Não era de se esperar boas coisas de alguém, principalmente uma mãe, que maltratava e enganava o filho com naturalidade e sem culpa. – Você não está se precipitando? – Perguntou com receio da reação de Demi. – Olha, eu não consigo confiar nela... Não consigo pensar numa justificativa plausível para o que ela fez com você durante toda a sua vida. – Disse focada no transito. – É absurdo.

   - Eu sei que é, mas há motivos, Sel. Ela não escolheu ser assim. – Era verdade? Demi franziu o cenho pensando a respeito. Dianna tinha se moldado a situação, tinha se entregado de cabeça. A culpa era dela por não poder lutar?

   - Ela escolheu. No dia que ela resolveu te tratar como um lixo, ela escolheu ser assim. Você não tem culpa. – Selena tinha razão, ela sempre tinha. Demi a observou calada dirigir pacientemente pelas ruas cobertas de neve já à noite. As expressões sérias e o cenho as vezes franzido.

   - O meu a.. o pai do meu pai a estuprou. Ela estava grávida. – Disse um pouco nervosa e Selena desviou o olhar do transito para olha-la. – Era uma menina de apenas dezessete anos quando se apaixonou, engravidou e foi violentada. Os sonhos, a felicidade, a segurança, a dignidade. Ela perdeu tudo quando... quando aconteceu. E teve que lutar para cuidar de uma criança praticamente sozinha. – Sel não disse uma palavra e Demi não a julgou. Não era como se ela não tivesse abalada, bem pelo contrário, as feições estavam ainda mais sérias e os pensamentos comprometidos em estudar as palavras de Demi.

O aeroporto internacional John F. Kennedy era o lugar mais provável onde Dianna poderia partir para outro continente. Lá fora nevava e o escuro da noite era quebrado pela luz dos postes que iluminavam o local. Demi e Selena caminharam agarradas para combater o frio no estacionamento a céu aberto, e quando passaram pelas portas de vidro, os olhares perderam-se na multidão. Dianna poderia estar em qualquer lugar e entre as milhares de pessoas que ali estavam.

   - É melhor nós procurarmos na área de embarque. – Disse Selena ainda perdida observando a quantidade absurda de pessoas. Demi assentiu porque era o mais inteligente a fazer. Elas caminharam por entre a multidão, subiram de escada rolante para o andar de cima e apressadamente caminharam quando ouviram a chamada de um voo.

   - Mãe? – Demi se precipitou, desenlaçou os dedos dos de Sel e abordou a mulher loira vestida de preto que se preparava para embarcar. Não havia muita semelhança com Dianna, apenas as roupas luxuosas. – Desculpa. – Disse educadamente a mulher quando ela se virou para olha-la surpresa e assustada. Demi olhou atentamente para o máximo de mulheres que conseguiu sem sucesso.

   - Vamos pedir informação. – Selena gentilmente a tocou no ombro e enlaçando os dedos como elas tinham feito mais cedo, puxou-a em direção a área central onde havia funcionários do aeroporto.

 O tom usado foi impecável. Sel conversou com a recepcionista sobre os voos para o Reino Unido, já que tinha notado que Demi estava incapaz de administrar uma conversa. Era agonizante como ela estava nervosa e ansiosa. Três voos já tinham saído em direção a Londres e um a Dublin. E não havia mais voos agendados para aquele dia.

   - Eu estou aqui. – Carinhosamente Selena beijou o topo da cabeça de Demi quando ela a abraçou e chorou como uma criança perdida e amedrontada. Era exatamente aquele ponto que Selena não conseguia entender. Se Dianna tinha deixado uma carta antes de partir, era porque ela se arrependia. Mas porque continuar machucando Demi? Ela não merecia mais sofrer. – Ei, meu amor. Eu sei que as coisas nunca são como nós desejamos, isso dói, mas nós precisamos ser fortes para continuar. Ela foi embora. Não sabemos ao certo os motivos, mas vamos pensar que isso pode ser bom para ela. Pensa que... que você pode ter uma nova Dianna daqui alguns anos.

   - Eu não sei. – Murmurou chorava desviando o olhar de Selena para fitar as mulheres loiras na esperança de encontrar Dianna. – Ela me pediu para ser feliz, para encher a casa de netos que ela nunca vai conhecer. Eu não posso permitir isso, Sel. – Selena limpou as lágrimas que rolavam pelo rosto de Demi e a beijou na testa. – Ela passou por tantas coisas ruins, estou começando entende-la.

   - Não se deixe enganar por palavras. Atitudes são atitudes. – Disse Selena fitando os olhos de Demi que a abraçou procurando por conforto e segurança. A movimentação naquela área não permitia a privacidade adequada que elas precisavam. Selena limpou as lágrimas de Demi, envolveu os dedos aos dela e sem pressa, guiou-as para uma cafeteira ali mesmo no aeroporto. – Um Baunilha Latte para viagem. – Disse a atendente escorada no balcão da cafeteria. – Você vai querer alguma coisa para comer? – Perguntou a Demi que estava perdida em pensamentos, tanto que fitava o piso de madeira alheia ao ambiente. – Dem, você vai querer comer alguma coisa? – Tornou a perguntar e Demi franziu o cenho voltando o olhar na direção da porta que foi aberta fazendo com que o barulho agudo do sininho soasse.

   - Biscoitos doces ou muffins de chocolate e canela, eu não sei, escolhe você. – Ela acabou abraçando Selena de lado e choramingou no pescoço da amiga.

   - Vou escolher os muffins só porque sei que são os seus favoritos. – Disse Selena envolvendo Demi num abraço apertado sem se importar se algumas pessoas acomodadas as mesas lançavam a elas um olhar curioso.

   - Minha cabeça está doendo, Sel. – Resmungou. Demi franziu o cenho porque Selena tinha pagado a conta e ao invés de se acomodar a uma mesa ali dentro mesmo onde estava quente e confortável, a amiga a puxava pela mão para fora do estabelecimento.

   - O que foi? – Perguntou Selena percebendo o olhar de Demi. – Comprei café e biscoitos para você. – Explicou-se. – Você queria comer na cafeteria? Pensei que você poderia comer dentro do carro... Teríamos mais privacidade. – Estavam próximas a escada rolante ali perto da cafeteria. Selena estava tão sem jeito, que ela colocou uma mecha do cabelo atrás da orelha e desviou o olhar de Demi.

   - Selena, o que está acontecendo? – Perguntou juntando toda a coragem para sustentar o olhar da amiga. – Eu estou preocupada, o Ed está preocupado, e até o Joe que é um pouco lerdo percebeu que você não está bem.

   - Nós conversamos no carro, ok? Prometo que vou explicar tudo. – Demi assentiu só porque Sel não tinha desviado o olhar, e ela ainda ofereceu a mão que elas pudessem enlaçar os dedos. E assim foi feito, desceram a escada rolante lado a lado, o que não era uma ideia muito agradável e nem inteligente, mas era daquela forma que elas faziam as coisas. Quando saíram do aeroporto, o vento soprou frio que doeu na alma. Agarradas, caminharam para o carro uma ajudando a outra a administrar toda a neve.

   - Por favor, liga o aquecedor na temperatura máxima. – Demi bateu os dentes. Agora sim com a chegava da noite estava frio, muito frio e ela temeu por Joe. Ele estava um pouco longe de Nova York, o sítio de Steve ficava a mais ou menos quarenta minutos de carro. As estradas estavam perigosas e Demi não fazia ideia de como seria o trabalho que o namorado tinha para fazer, só esperava que ele ficasse bem e aquecido.

   - Não seja exagerada. – Selena forçou um sorriso enquanto ligava o carro para depois o aquecedor. – Está melhor? – Perguntou e Demi assentiu se acomodando mais ao banco.

   - Você pode falar? Eu estou curiosa. – Disse sem nem mesmo se interessar no café e muffins que Selena entregou para que ela segurasse.

   - Você não vai comer? – Selena relaxou no banco mantendo as mãos no volante o apertando para tentar dissipar o nervoso nele.

   - Sel.. – Murmurou Demi de cenho franzido e quando Selena arqueou uma sobrancelha, ela se deu por vencida começando a abrir a embalagem onde estavam os muffins e tirando a proteção do canudo do café. – Eu sei, tomar café com canudo é uma droga. – Disse assim que deu a primeira sugada. – Você quer? – Ofereceu um pouco constrangida e Selena negou balançando a cabeça. – Não é como se nós nunca tivéssemos compartilhado algo tão íntimo como um canudo. – Comentou pensando no beijo que elas tinham trocado e a risada fraca de Selena a surpreendeu.

   - Se você está insinuando que eu estou com nojo, não é isso, eu realmente não quero comer ou beber. – Explicou-se colocando uma mecha do cabelo atrás da orelha. – Estou falando sério. – O bom era que o estacionamento era iluminado o suficiente para que Sel pudesse enxergar os olhos de Demi no interior do carro. – Não comi nada hoje. – Falou e Demi que mordia um muffin franziu o cenho. – Aliás, levei café da manhã para o Ed na cama. O que eu comi, coloquei para fora. O almoço também. Desde então, preferi evitar me alimentar. Eu estou me sentindo estranha, Dem. Não suporto a ideia de comer, e fico enjoada com alguns cheiros. – Selena encostou a cabeça no volante e fechou os olhos quando as primeiras lágrimas rolaram. Já Demi sentiu o coração bater mais rápido e as bochechas esquentarem.

   - Ei, Sel. Eu estou aqui. – Ela deu um jeitinho de colocar o café no suporte da porta do carro junto com os muffins. – Você está.. está grávida? – Perguntou timidamente tocando a coxa de Selena que abriu os olhos e piscou algumas vezes.

   - Não sei. Tem dois testes na minha bolsa, não tive coragem de fazê-los sozinha. Não quero falar com o Ed sobre e nem com a minha mãe. Eu só precisava de você. – Demi a puxou para um abraço e dessa vez, foi ela quem consolou Selena dizendo que tudo ficaria bem independente do resultado dos testes.

   - O que você está sentindo além de enjoos? – Demi perguntou depois de acariciar o rosto da amiga e secando as lágrimas.

   - Estou sonolenta, algumas vezes fico irritada e emocionada. Tem uma semana que estou assim, mas só hoje fiquei enjoada. – Explicou e Demi assentiu pensando no que elas fariam.

   - Você está bem para dirigir? – Perguntou preocupada. – Eu posso guiar o carro, você pode me ajudar com a marcha. – Sugeriu tímida e Sel riu se acomodando melhor a poltrona.

   - Estou bem. Não é hoje que você vai nos matar. – Brincou para descontrair o clima e Demi revirou os olhos com vontade. Da última vez que ela tinha tentado dirigir, quase resultou numa tragédia, mas no final de tudo, as duas gargalharam de nervoso.

   - Vamos para o meu apartamento. Você pode fazer os testes lá.. E depois nós decidimos se vamos ou não a festa. – Selena assentiu concordando com a ideia, mas ainda sim estava nervosa. – Eu estou aqui, ok? – Demi enlaçou os dedos as de Selena e se curvou a beijando demoradamente na bochecha direita. – Seja qual for o resultado, nós ficaremos juntas. – Sel assentiu apertando os dedos aos de Demi e respirando fundo pensando nas palavras que tinha ouvido.

Os pensamentos de Demi se alternavam entre Dianna e Selena. As duas estavam a preocupando ao extremo, mas infelizmente sobre o caso da mãe, Demi estava de mãos atadas, só restava esperar. Então Selena tinha prioridade total, Demi conversou com a amiga para distrai-la e observou como Nova York ficava linda debaixo de neve. Nem mesmo à noite conseguia escurecer por completo aquela cidade. Os letreiros luminosos ficavam ainda mais vivos e era fascinante como os arranha-céus refletiam as luzes deles e as dos postes tornando o momento mágico. Quando passaram pelo complexo do Rockefeller, Demi sorriu observando as crianças brincando na pista de patinação e a enorme árvore de natal estava começando a ser montada.

   - Se não estivesse nevando, nós poderíamos ir ao Top of the Rock. – Comentou Demi olhando para trás para poder ver o prédio enquanto Selena guiava o carro para a garagem subterrânea do prédio.

   - Da última vez que inventamos de subir septuagésimo terceiro andar nevando, nós quase morremos congeladas, Demetria. – E na época elas tinham apenas dezessete anos e nenhum um juízo. As duas ficaram resfriadas por uma semana inteirinha sobre os cuidados e broncas de Mandy.

   - Eu sei, não precisa ficar brava comigo. – Demi riu do olhar feio de Selena e para pirraça-la, acariciou-a no braço e disse: - Boa garota, boa garota.

   - Piralha! Você é uma peste, Dem. – Reclamou mal-humorada parando o carro na vaga livre. – Às vezes tudo que eu queria era dar umas boas palmadas no Ed e em você. – Comentou tirando o cinto de segurança e Demi fez o mesmo logo saindo do carro com um sorriso sapeca nos lábios.

   - Não fica brava, ok? – Com muito custo ela pegou o café já morno e os muffins. Ruim foi para fechar a porta do carro já que as duas mãos estavam ocupadas. – Eu estou preocupada com a minha mãe. – Não tinha como se esquecer de Dianna. Demi enlaçou o braço ao de Selena para que elas caminhassem em direção ao elevador. – Será que ela tem dinheiro ou um lugar para morar? Ela está indo viver em outro país! Estou com medo por ela.

   - Se ela foi, é porque já tinha tudo planejado. – Disse Selena com receio de falar coisas sobre Dianna que poderiam magoar Demi. – Talvez ela tenha algum amigo ou conhecido que vai ajudá-la a se estabelecer.

   - O lugar dela é aqui, comigo, em Nova York. Mas espero que sim, ela não merece passar por coisas ruins. A vida já foi cruel o suficiente. Eu só espero que ela seja feliz. Vou sentir muita saudade. Vou tentar entrar em contato, quem sabe ela responde. – Era o mínimo que ela esperava. Dianna poderia pensar que ela estava magoada porque era verdade, mas se pensasse que ela não se importava, estaria muito enganada. O elevador logo chegou, e Demi deu graças a Deus por estar vazio. Ninguém merecia ter que dividir o espaço já pequeno com vizinhos malcriados.

   - Eu acho que ela entrará em contato. – Murmurou Selena. Para ela, na primeira dificuldade que Dianna encontrasse, ligaria para Demi para pedir dinheiro. Se era assim em Nova York com a vida fácil, imagina no outro lado do mundo... – Não se precipite, ok? – Demi assentiu puxando Selena para fora do elevador quando chegaram ao andar onde ela morava. Foi complicado não ficar nervosa ou tensa.

   - Vai dar tudo certo, Sel. – Disse calmamente abrindo a porta do apartamento e dando passagem para Sel adentra-lo. – O que você quer fazer agora? – Perguntou toda carinhosa e esboçando um sorriso verdadeiro para Selena. Demi levou o café e os muffins para mesa da sala os deixando lá junto a bolsa.  

- Eu não sei, estou com medo. – Selena se acomodou ao sofá repousando os cotovelos nas coxas para sustentar a cabeça com as mãos. – Eu não sei se estou preparada para ser mãe de verdade. Está tudo acontecendo tão rápido. Parece que terminamos a escola ontem, depois veio a faculdade, os vinte e um anos.. E agora talvez um bebê? Acho que eu preciso que as coisas aconteçam mais devagar. – Demi a abraçou de lado envolvendo os dedos aos dela.

   - Um bebê seu e do Ed. Não poderia ser melhor. Ele é o cara certo, é o cara que você ama, não é? – Perguntou baixinho e quando Sel a olhou, assentiu. – Não tem porque ter medo. Se realmente tiver um bebê na sua barriga, nós vamos cuidar muito bem de você, vamos enchê-la de mimos e quando completar os nove meses, prometo que vou estar ao seu lado na sala de parto segurando a sua mão. – Demi sorriu fitando os olhos de Selena que derramou algumas lágrimas, mas que também sorriu emocionada. – Vou ser a melhor madrinha desse mundo, prometo. Quero que você saiba que eu vou, sempre e sempre, estar aqui para você.

   - Não tenho dúvidas que você será a melhor madrinha. – Selena sorriu gostando da ideia. Quando mais novas, elas já tinham conversado sobre a época que encontrariam um cara legal para casar e ter filhos, e ficou combinado que uma seria madrinha do filho da outra. – E se o Ed não gostar? – Perguntou com receio. – Ele já tem duas crianças para cuidar.

   - Se ele não gostar, ele estará sendo um babaca. Vocês estão namorando, a  gravidez sempre será, mesmo que pequena, uma possibilidade. Nenhum método é completamente confiável.  

   - Tudo bem, você tem razão. – Selena fechou os olhos e respirou fundo. – Eu estou com medo, mas sei que você está aqui comigo. – Demi assentiu e como sabia que Selena precisava de tempo para processar o que faria, preferiu ficar calada a enche-la de medos e dúvidas.

   - Você pode usar o banheiro do meu quarto. – O nervoso foi tão grande quando Selena abriu a bolsa e pegou os dois testes de gravidez. Era uma sensação sufocante misturada a ansiedade e uma felicidade oculta. Quando Sel ofereceu a mão a Demi, ela a segurou e as conduziu para o quarto principal do apartamento. – Eu estarei aqui para você, e o Ed também, tenho certeza que estará. – Parecia que quem iria fazer aquele teste gravidez era ela. Demi se sentou a cama, pegou a pelúcia que tinha ganhado do namorado e descontou a ansiedade a apertando. Foram incontáveis os minutos de silêncio absoluto. Demi umedeceu os lábios e de tão ansiosa que estava, fitou diferentes pontos do quarto até que Selena a chamou baixinho e chorosa.

   - Positivo. – A prova estava lá. Aliás, as provas. Demi nem se importou com os testes, agachou-se e abraçou Selena que estava sentada sobre a tampa do vaso sanitário.

Elas ficaram em silêncio compartilhando do abraço que Selena precisava. Ter um bebê não era fácil, Demi se lembrou das palavras de Dianna naquela carta e prometeu para si mesma que cuidaria de Selena, que não deixaria que a melhor amiga passasse por dificuldades e nem por situações absurdas. Uma cuidava da outra. Sempre foi daquele jeito e não mudaria agora que a pequena família que elas tinham aumentaria.

   - Vem, aqui está ficando frio. – E Selena a acompanhou sem dizer uma palavra. Demi a ajudou a tirar as botas e a deitou na cama logo buscando a coberta no closet para protege-las.

   - Você pode me abraçar? – Sel perguntou chorosa e Demi o fez sem pensar duas vezes. Acolheu o corpo delicado em seus braços e beijou a testa de Sel carinhosamente deixando que ela descansasse. – Eu... Eu não sei como me sinto. – Disse Selena minutos mais tarde e Demi umedeceu os lábios e mordeu o inferior para conter o sorriso.

         - Eu estou muito feliz. – Comentou sem conseguir se controlar. – Vou ser a melhor dinda desse mundo. – Selena riu olhando para Demi e foi aí que ela percebeu do que se tratava. Uma criança estava a caminho. Foi de surpresa, sem qualquer planejamento, mas não importava. O significado era tão grande e especial. Era a prova viva do amor dela e de Ed. E estava ali crescendo timidamente no interior.

   - Eu vou ser mãe. – Disse desacreditada e sorridente. Demi sorriu de orelha a orelha e envolveu Selena num abraço exagerado e sufocante, beijou-a nas bochechas e fitou a barriga lisa da amiga com um sorriso de orelha a orelha.

  - Eu já te amo, bebê. – Sel chorou quando a barriga foi beijada e então ela levou a mão para acaricia-la sentindo o coração bater mais rápido em ansiedade e felicidade. – Eu nem acredito. – Demi sorriu fitando os olhos de Selena. – Parabéns, Sel. Você será muito feliz. – O sorriso não saía dos lábios dela, e ao fita-la, Selena também sorriu contagiada deixando algumas lágrimas rolarem enquanto a mão acariciava a barriga que nem dava sinal que crescia por aqueles nove meses.

Dentro de mais ou menos uma hora, foi o tempo suficiente para Demi conseguir tirar Selena do sério. Elas riram, discutiram, mas no final estavam felizes e praticamente coladas. Demi deslizou a mão pela barriga da amiga e sorriu como uma criança feliz logo acomodando a cabeça no peito de Selena que riu.

   - Dem.. – Chamou e quando Demi a olhou, as duas ficaram um pouco nervosas. Era necessário tomar atitude para resolver aquela situação. Joe tinha razão, ela deveria abrir mão do orgulho e fazer o que era necessário para que elas ficassem bem.

   - Sobre aquela noite. – Tomar atitude era uma coisa e as bochechas coradas era outra. Demi se deitou a cama e fitou o teto para que conseguisse organizar os pensamentos. – Eu não queria ficar longe de você por todo esse tempo. – Comentou arriscando olhar Selena que assentiu se erguendo.

   - Eu também não. – Murmurou fitando os próprios dedos. – Eu não sei como chegamos a esse ponto. Confesso que depois eu fiquei com muito receio e medo do que poderia significar.

   - Na hora, eu não consegui pensar em nada. – Disse Demi se lembrando do momento. – Eu.. eu gostei, gostei muito. – Ela se ergueu e umedeceu os lábios fitando os olhos de Selena. – Vou ser sincera com você, Sel. Meus sentimentos por você continuam os mesmos. O nosso beijo não significou nada.

   - Eu também gostei. – Selena sorriu e Demi também mesmo envergonhada. – E os meus sentimentos continuam os mesmos. Tanto em relação a você quanto ao Ed. Sabe, eu acho que nós finalmente matamos a nossa curiosidade. Confesso que sempre pensei em como seria te beijar.

   - O ruim foi o que veio depois. Não quero ficar mais esse tempo todo longe de você. – Disse Demi. – Eu também. Acho que nós fizemos tempestade num copo d’água porque gostamos do que aconteceu, e tem os meninos. Eu contei para o Joe.

   - Você contou? – Selena arregalou os olhos e Demi arqueou as sobrancelhas. – O que ele disse? – Perguntou colocando uma mecha do cabelo atrás da orelha e sustentando o olhar de Demi.

   - Nada exatamente. Ele não ficou bravo, só surpreso e perguntou o que significava para mim. Ele disse que só entendia porque era você. – Demi sorriu fraco pensando em Joe. Ela já sentia falta de sentir o olhar penetrante e das bochechas coradas de Joe.

   - Eu não contei para o Ed. – Disse mais calma. – Você sabe, ele é escandaloso. Sinceramente, não sei como ele reagiria. Ele sempre me importunou sobre nós duas.

   - Eu acho que ele vai surtar, ou talvez não. Já o pirracei sobre isso, disse que eu te tomaria dele, se ele não cuidasse bem de você.

    - Vocês dois são bobos. – Selena se mexeu com receio. Ela ainda estava assustada com a ideia de estar carregando uma vida. – Então nós estamos bem sobre isso?

   - Estamos. – Demi sorriu para Selena e a atacou com um abraço exagerado que resultou em tantas reclamações, sem contar que ela quase foi esbofeteada pela amiga. – O que foi? Deixa de ser chata, eu não posso te abraçar e ficar agarrada a você? Senti sua falta e te amo. – Ronronou manhosa e Selena revirou os olhos, mas abraçou Demi com a mesma força que era abraçada.

   - Eu também amo você, piralha. É só que eu estou com receio de me mover. – Demi franziu o cenho e quando entrou no campo de visão de Selena, o cabelo estava uma bagunça e os olhos marrons expressavam felicidade e inocência.

   - Você não está falando sério, está? – Perguntou achando graça e Selena a acertou com um tapa no traseiro. – Chata. Nós vamos a festa? – Sair do conforto que o apartamento oferecia era uma péssima ideia. Demi não conseguia pensar numa forma daquela festa ser divertida. Joe não a acompanharia. Selena precisava de alguns dias longe do trabalho e eventos como aquele para organizar a vida com a família que estava construindo ao lado de Ed. Ou seja, os dois amigos estavam ocupados e o namorado trabalhando.

A decisão foi baseada tanto na opinião de Demi quanto na de Selena. Ficou combinado que elas iriam à festa da Gyllenhaal em consideração ao trabalho que tiveram para organizar o evento e em memória de Jason.

O resultado de duas mulheres juntas dentro de um closet era simplesmente o caos. Havia tantos itens de beleza esparramados. Os sapatos também faziam parte da bagunça. Era muito barulho para apenas duas pessoas. A música que vinha do celular de Selena se misturava a conversa ora calma ora conturbada. A amizade era simplesmente sustentada por amor e ódio. Quando Demi não implicava com Selena e a pirraçava, era Sel que o fazia com Demi.

   - Quase oito e meia. – Demi odiava pressão, principalmente quando estava se arrumando. Pegando o potinho do rímel, ela se sentou de lado no colo de Selena e ordenou que o rosto fosse direcionado para a luz e que Sel não piscasse. – Eu quero delineado gatinho, ok? – Como não se lembrar de Joe? Demi murmurou um “aham” e começou o trabalho.

   - Hum.. acho que alguém está faminta. – Cantarolou quando o ouviu o barulho que vinha da barriga de Selena justamente no início de uma música. – Você quer uma fruta? Acho que não terá problema. – Disse gentilmente depois que tinha traçado a linha escura na borda da pálpebra direita.

   - Obrigada, mas eu prefiro ficar sem comer. Vomitar é horrível. – Demi cerrou os olhos quando Selena abriu os dela piscando algumas vezes.

   - Você precisa se alimentar, mamãe. Tem um bebezinho que precisa que você fique fortinha para ele crescer saudável. – Ela estava tão animada com a ideia de Sel ter um bebê que levou a mão a barriga da amiga e a acariciou sorrindo feliz.

   - Dem! Pelo amor de Deus, vai devagar. – Reclamou Selena corada e ainda digerindo a descoberta da gravidez. Ficar ao lado de Demi era tão bom que ela tinha esquecido a história, até então. – Eu ainda não me acostumei.. É estranho. – Disse fechando os olhos para que a segunda pálpebra fosse traçada com o delineado.

   - Quando você vai contar para o Ed? – Perguntou curiosa ignorando as reclamações de Selena.

   - Eu não sei.. – Resmungou franzindo o cenho sentindo o gelado do líquido do delineador irritar os olhos, mas logo ela se acostumou. – E não conta para ninguém, nem para o Joe.

   - Sel, eu não posso esconder nada do meu amor. Eu simplesmente não consigo. E o Joe não é fofoqueiro, ele sabe guardar segredo.

   - Nós sabemos que ele sabe guardar muito bem um segredo. – Reclamou Selena se referindo a Inácio e Dianna, e Demi revirou os olhos porque já tinha perdoado Joe e Ed.

   - Por que você guarda tanto rancor? Já passou, e ele só não me contou porque estava com medo. Eu o entendo. – Explicou-se agora buscando pelo rímel para alongar os cílios e dar volume a eles.

   - Você perdoa tão rápido. – Comentou e Demi arqueou as sobrancelhas quando a olhou. – Estou falando sério. Isso não se faz. O Joe deveria ter contado sobre o seu pai assim que ficou sabendo. Odeio segredos e mentiras. – Resmungou e Demi tentou associar o mal humor a gravidez.

   - Ele deveria, mas ele não sabia o que era verdade e nem o que era mentira. Tente entende-lo. – Disse se levantando e Selena negou balançando a cabeça. – E eu não aguento ficar muito tempo longe dele, agora mesmo estou morrendo de saudade. Eu só queria estar na cama com o meu bebê o mimando e fazendo amor com ele.

   - Estou tentando, e tudo que eu consigo pensar é em como ele vacilou. – Era mal humor. Demi revirou os olhos para Selena e quando tocou no vidro do perfume, desistiu de usá-lo porque certamente causaria enjoo na amiga. – Hum, ao menos vocês estão bem? – Perguntou mais amigável.

   - Muito bem. Eu cuido dele, e ele de mim. Eu o amo, Sel. Nesses últimos três meses, nós estamos mais familiarizados um com o outro, conversamos abertamente sobre praticamente tudo e passamos boa parte do nosso tempo brincando com a Lucy, assistindo desenho e namorando.

   - Só vocês para assistir desenho. – Reclamou e Demi riu se lembrando das vezes que ela e Joe assistiam desenho...

   - Assistir desenho tem lá suas vantagens. – Um sorriso malicioso dizia tudo. Demi riu logo em seguida buscando por um par de brincos.

   - Você acabou com a inocência do coitado, Demetria. – Demi riu alto, mas também corou.

   - Nós estamos apaixonados, o que tem de errado? E eu não acabei com a inocência dele. – Resmungou e Selena arqueou uma sobrancelha abraçando Demi por trás.

   - Não tem nada de errado. Eu só estava pensando: eu estava preocupada com você o tempo todo sobre camisinha e anticoncepcional, e eu que fiquei grávida. – Demi riu alto e fitou os olhos de Selena pelo espelho.

   - É, eu e o Joe nos protegemos, só quando estamos desesperados que não usamos preservativo. Quando ele vai tomar a insulina, eu tomo a pílula. Você acha que o anticoncepcional falhou? – Perguntou a Selena desfazendo do abraço para terminar de se arrumar com um sutil batom vermelho.

   - Eu não sei, não faço a mínima ideia. É muito complicado para nós, as crianças não dão sossego à noite e de dia nós estamos trabalhando. Provavelmente foi numa rapidinha no chuveiro ou quando transamos no estacionamento da Gyllenhaal algumas semanas atrás. – Demi arqueou uma sobrancelha e riu conferindo se o batom estava bom.

   - Eu e o Joe temos sorte, só que quando estamos no apartamento dele, temos que despistar a Lucy ou tranca-la na área de luz. – As duas acabaram rindo e em meio as conversas, finalizaram a maquiagem e a roupa.

   - Não fica nervosa. Se você se sentir mal, é só me falar que voltamos para casa. – Disse Demi a Selena aproveitando para colocar uma mecha do cabelo pesado da amiga atrás da orelha. – Eu estou bonita? – Perguntou a Sel.

   - Está linda. – Selena sorriu arrumando a jaqueta de couro ao torso de Demi. – Sempre está. – As duas sorriram felizes por estarem juntas. – Dem, não conta para o Ed, ok? Eu ainda estou me preparando para contar. Estou com medo da reação dele.

    - Não contarei. Você sabe que ele ficará feliz, isso é especial para vocês. – Demi forçou um sorriso porque ela se lembrou de Dianna. Pelas palavras escritas na carta, ela realmente estava feliz por descobrir que estava grávida. Era uma nova perspectiva de futuro, até que os sonhos foram destruídos.

   - Ele pode ficar bravo, não estava nos nossos planos. – O olhar tristonho Demi não aceitava. Guiou a mão ao rosto de Selena para ergue-lo e franziu o cenho ao olha-la nos olhos.

   - Se ele ficar bravo, só mostra que ele é um idiota que não merece você e nem o bebê que você está esperando. Você tem a mim, e eu vou estar ao seu lado para te apoiar e cuidar de vocês. – Um abraço tornava tudo mais especial e real. Demi acariciou as costas de Selena e fechou os olhos sentindo o coração transbordar de felicidade e amor. Já Sel se sentiu segura e mais calma por saber que alguém estava torcendo por ela. – Vamos? Quero ficar só um pouquinho lá, se quiser, nós podemos vir para cá e passar a noite juntas.

   - Se eu me comportar mal com o Ed, fico aqui com você. Agora que eu tenho certeza que estou grávida, não sei se vou conseguir controlar as minhas emoções perto dele. – Disse chorosa e Demi sorriu achando que Selena estava simplesmente fofa, manhosa e grávida.

   - Está tudo bem. Você pode ficar aqui o dia que quiser. – Agora Sel era prioridade e o único motivo que Demi deixaria de passar a noite nos braços de Joe.

Simplesmente estranho. Mudanças de humor repentinas era normal na gravidez? Demi não sabia, pois só tinha visto mulheres grávidas na rua. Nunca tinha convivido com uma. O processo de caminhada até o carro na garagem subterrânea foi uma aventura cheia de surpresas. Uma hora Selena a agarrou pelo braço e ficou calada, simplesmente não dava para identificar o que ela estava sentindo. Já quando estavam acomodadas dentro do carro, Sel começou a falar sem parar sobre Ed e como os pais surtariam quando soubessem que ela estava grávida.

   - Sel, não é como se eles não soubessem que o seu namoro com o Ed é sério. – Comentou mais envolvida em trocar mensagens com Joe do que nas reclamações de sel. – Hum.. No fundo eles sabem que pode acontecer. Quando nos envolvemos com alguém com esse nível de intimidade, estamos sujeitas a engravidar e tudo mais. – Demi colocou uma mecha do cabelo atrás da orelha e antes de fitar a tela do celular, ela olhou para Sel porque ela tinha parado o carro numa sinaleira.

   - Demetria, você sabe que eu odeio conversar com alguém que não está prestando atenção em mim. Você escolhe: eu ou o celular. – Demi franziu o cenho e arregalou os olhos.

   - Dá para parar de ser chata? – Resmungou bloqueando o celular. Aquilo não era gravidez. Selena realmente sempre implicava quando Demi ficava no celular e mantinha aquela conversa sem emoção. – Você deveria relaxar. Quando não está mal-humorada ou chata, está preocupada. Isso não faz bem para o bebê e nem para você. – Demi engoliu em seco quando viu os raios de luz que cruzavam o céu, eles vinham dos canhões de luz que sinalizavam o local onde estava acontecendo a festa da Gyllenhaal a poucas quadras de onde elas estavam.

   - Eu sei. Não consigo evitar, ok? Estou nervosa, é muita coisa acontecendo na minha vida. – Demi assentiu e apertou os dedos aos dela sobre a marcha do carro.

   - Tenta pensar em outra coisa. – Comentou louca para desbloquear o celular e continuar conversando com Joe, se bem que as vezes ele sumia porque a internet no sítio não estava funcionando bem e também o trabalho era árduo, as fotos estavam lá para comprovar. – Sei lá, você assistiu algum desfile nesses últimos dias? – Perguntou e Selena franziu o cenho.

   - Ah, não. – Disse mais relaxada procurando por um lugar para estacionar o carro. – Estou sem companhia, a Mary sumiu tem mais ou menos umas duas ou três semanas. Ela não atende ligações, não responde mensagens e eu não a vi no trabalho. – Demi mordeu o lábio inferior estranhando. Naqueles três meses, ela via com certa frequência Selena e Mary juntas.

   - Estranho. Não há registro de faltas. Ela está batendo o ponto normalmente e o trabalho está sendo feito. Eu também não a vi. – Comentou forçando a memória e nada de Mary, aliás, não tinha muito do que se lembrar. Nas últimas semanas Demi estava envolvida com o trabalho da empresa e o adicional da festa. Ela entrava e saía do escritório tão envolvida que nem tinha notado a falta de Mary ou qualquer outra pessoa.

   - Isso é completamente bizarro porque a mesa dela está intacta. Ela não apareceu, Dem. – Selena arregalou os olhos ao olhar para Demi que não soube o que dizer. – Você tem certeza que esses registros existem e que são dela? – Perguntou concentrada em encaixar o carro numa vaga complicadíssima porque ficava entre dois carros que eram maiores.

   - Sel, quando alguém falta sem ter um atestado ou qualquer justificava, o pessoal me chama para saber o que está acontecendo. Eu sou a responsável pelo nosso departamento, se a Mary estivesse faltando, eu saberia. – Era difícil estar naquele cargo. Orientar e gerir pessoas era uma atividade que exigia muito mais que um diploma e conhecimento técnico e acadêmico.

   - Eu não estou maluca. Alguma coisa de errado está acontecendo. – Disse Selena tirando o cinto de segurança e Demi assentiu calada pensando na situação.

***

A cobertura do prédio estava projetada para enfrentar qualquer uma das estações do ano. Mesmo com a neve caindo sutilmente lá fora, a vista da cidade ainda era um charme e de tirar o fôlego. Vinho caro, comida de nome complicadíssimo, música tocada por uma banda, um punhado de mesas impecáveis espalhadas, garçons bem alinhados e educados servindo, gente bonita, rica e de nariz em pé. Dava para ser mais chato? Demi tinha sido recebida com uma chuva de flashes. Já Selena não teve tanta atenção como a amiga, e agradecia, pois, sentia que se ficasse sobre um flash novamente, vomitaria.

Não foi como Demi tinha pensado. Bem, por algum tempo ela teve certa atenção, a atenção que tanto temia. Algumas pessoas cochicharam com os seus acompanhantes sobre quem ela era. Não tinha como não perceber, porém passou tão rápido quanto começou.

   - Você está falando com o Joe? – Demi desviou o olhar da tela do celular para fitar os olhos verdes de Ed. Ele estava sentado ao lado de Selena e a abraçava de lado descontraído e relaxado degustando a bebida cara que era servida.

   - Tentei falar com ele, mas acho que agora a internet não está funcionando mesmo. – Comentou tristonha porque as mensagens eram enviadas, mas nem mesmo chegavam para Joe.

   - Entendi. O que vocês estão achando? – Perguntou Ed terminando a primeira taça e Demi fez como o amigo, bebeu o líquido cor de champanhe em alguns goles porque não tinha nada melhor para fazer. – Até que não está o ruim, digo, o clima. Acho que eu nunca estive numa festa cara como essa. – Comentou observando a taça vazia apostando que ela era de cristal.

   - Se o Joe estivesse aqui, até que eu poderia dizer que está sendo legal, mas como eu estou segurando vela para vocês, está chato e eu não vejo a hora de ir embora. – Brincou Demi para tentar ajudar Selena a relaxar, mas ela só negou com a cabeça claramente neurótica com Ed que se curvou para beija-la. – Obrigada. – Disse quando o garçom encheu mais a taça dela e a de Ed.

   - Sel, você não vai beber nada? – Perguntou o rapaz fitando o rosto da namorada e Demi preferiu não olha-los porque queria dar privacidade para o casal.

Com o dinheiro de toda aquela gente, dava para colocar comida em muitas mesas e educar muitas crianças e jovens. Demi fitou as pessoas conversando e rindo alto, cada um mais elegante que o outro em suas roupas caras. Enquanto muitos tinham dinheiro de sobra, outros não tinham o que comer. Foi de uma família pobre que ela veio. De duas mulheres que chegaram ao fundo do poço para continuar vivendo. Pensando na história que contava na carta da mãe, Demi bebeu o líquido da taça e respirou fundo de cenho franzido. Será que Dianna estava bem? Será que ela teria o que comer e onde dormir assim que chegasse a Deus sabe onde? Aquilo não se fazia! Definitivamente não. Sumir no mapa era a pior decisão que Dianna poderia tomar. Quando Demi olhou para Selena e Ed, encontrou-os trocando um beijo que era sutil mesmo na mesa mais afastada onde estavam. O celular vibrou e estranhando o nome na tela, Demi se levantou sem chamar a atenção de Selena e nem a de Ed. Poderia ser Dianna, o número era diferente e ela não se lembrava de ter visto número semelhante nos Estados Unidos.

   - Demi! Eu gostaria que a Srta. me acompanhasse em algumas mesas. Estão comentando sobre você, querida. – Marcus estava bêbado ou quase perto de estar. Demi não teve como negar, o então presidente da maior empresa tecnologias do país a conduziu nas respectivas mesas que tinha citado.

Era constrangedor e desconfortável estar no meio de pessoas tão importantes. Eram acionistas, fornecedores, concorrentes e até mesmo artistas. Demi tentou ser o mais natural e discreta possível, porém algumas pessoas já estavam afetadas pelo álcool e tinham reações claramente exageradas que eram o suficiente para deixa-la sem jeito. O celular tocou novamente e aproveitando que o assunto não a englobava, Demi conseguiu escapar daquele grupo e respirar aliviada. Infelizmente ela não conseguia driblar facilmente as pessoas. O sapato de salto alto não ajudava muito e também não dava para sair esbarrando em todos. Só foi uma pena que o celular parou de tocar quando ela finalmente focou toda atenção nele.

Os olhos de Demi arregalaram e ela não moveu um músculo. Aliás, pareceu que todas as pessoas da festa estavam tão chocadas quanto ela. Que tipo de justiça era aquela? O lugar de Jake era atrás das grades, não ao lado de Susan e de seus três filhos. Era demais para Demi. A sensação era horrível e desconfortável. Jake a fez passar por uma situação realmente ruim, assim como ele tinha feito com Selena e outras funcionárias da Gyllenhaal. Porém ele parecia arrependido? Culpado? Constrangido? Claro que não! Demi acompanhou o caminhar dele e da família, e quando o olhar cruzou com o de Jake, ele simplesmente o desviou como se não a conhecesse, como se não tivesse feito da vida dela um inferno.

            Impotente e sem graça, Demi caminhou sobre o olhar de algumas pessoas se sentindo envergonhada, principalmente dos colegas de trabalho. Ela era a amante, melhor, a ex-amante. Quase ninguém a conhecia como a usada, ou a assediada. As pessoas tinham o poder de pegar uma informação pura e manipula-la a ponto de inverter todos os papeis: a vítima passava ser o agressor e o agressor a pobre e inocente vítima.

   - Demi? Onde você estava? – Por que diabos Selena estava pálida? Demi se sentiu péssima ao fitar o claro desespero de Sel estampado nos olhos e nas feições assustadas.

   - Eu precisava atender uma ligação. – Disse abraçando Selena de lado porque ela estava com medo da amiga desmaiar ou algo do tipo. – Onde está o Ed? – Perguntou preocupada ajudando Selena caminhar para a mesa onde eles tinham se acomodado.

   - Ele foi buscar um copo com água. – Selena não podia desmaiar, Demi enlaçou os dedos aos dela e a observou atentamente.

   - Você está passando mal. – Disse e Selena negou engolindo em seco.

   - Eu só não consigo ficar no mesmo ambiente que ele. – Era claro que era Jake. Ele tinha a enganado, mas com Selena, ele foi bruto e intimidante até mesmo a ameaçando.

   - Desculpa por te fazer passar por isso. – Disse Demi preocupada com Selena e o bebê, e se sentindo culpada porque se ela tivesse acreditado nas palavras de Sel, muita coisa seria diferente. – Não vou deixar que ele te machuque, eu estou aqui por vocês. – Ao menos um sorriso, mesmo que forçado, Sel esboçou. Demi também tinha medo de Jake, porém a raiva era maior e para proteger Selena, ela faria de tudo.

   - Oi meninas. – O instinto de proteção de Ed estava em alerta. Ele se acomodou na cadeira que permitia a observação de tudo que acontecia com Selena e Demi. Se Jake lançasse um olhar na direção daquela mesa, ele estaria seriamente encrencado. – Você também quer água, Dem? – Perguntou observando Selena beber a água com certa rapidez para depois fitar os olhos de Demi.

   - Eu estou bem. – Disse Demi enlaçando os dedos aos de Selena. – Vamos para casa? – Perguntou para Selena depois de trocar um breve olhar com Ed.

   - Eu só preciso de um pouco de ar. Você pode ir ao banheiro comigo? – Era uma droga não poder contar para Ed o que estava de fato acontecendo, aliás, nem mesmo Demi sabia ao certo. Selena estava pálida e assustada. O bebê tinha que estar bem! Demi queria perguntar se havia alguma dor ou desconforto, mas Ed estava tão preocupado que ele não dava espaço para elas.

Preocupada, Demi assentiu balançando a cabeça dando alguns minutos a amiga e a Ed, que trocou de cadeira se sentando ao lado de Selena para poder conversar e examina-la melhor. Agoniada com a situação, Demi sentiu a cabeça doer e o nervoso toma-la. Sem querer ela procurou olha-lo entre as tantas mesas. O cenho enrugou-se e os pensamentos fugiram num piscar de olhos. Ninguém deveria se deixar levar por um sorriso, principalmente aquele sorriu que a seduziu meses atrás. Jake conversava com um dos acionistas da Gyllenhaal, Demi conhecia o homem de uma das reuniões de semanas atrás e se perguntava se as notícias estampadas no jornal não eram o suficiente para que as pessoas se revoltassem contra homens como Jake. Homens que não tinham a decência de respeitar uma mulher. Susan estava lá, jovem, bonita e graciosa com o caçula nos braços e olhando para o marido com admiração.

   - Demi? Vamos? – Desviando o olhar de Jake, Demi franziu o cenho quando fitou os olhos abatidos e cansados de Selena, mas assentiu se preparando para se levantar.

   - Eu vou espera-las aqui, quando vocês voltarem, nós vamos para casa. – Disse Ed fitando precisamente os olhos de Selena. – Se acontecer alguma coisa, é só me ligar, ok? – Disse para Demi que assentiu.

Desconcentrada, Demi envolveu o braço ao de Selena e começou a caminhar as guiando sem nem saber a direção do banheiro. Com a presença de Jake, as pessoas pareciam nota-las a ponto de Demi conseguir sentir os olhares que recebia conforme caminhava desorientada. Na mão livre estava o celular, e quando ele começou a tocar, Demi só percebeu porque o aparelho vibrava, porém não passou do primeiro toque e o número ainda era o desconhecido.

Como o lugar era grande, elas tiveram que recorrer a pedir informação primeiro para o garçom e depois para o segurança que estava na saída do salão. Conforme caminhavam na direção do banheiro, o barulho da festa ficava para trás assim como a movimentação.

   - Selena, tem alguma coisa de errado com o bebê? – Perguntou preocupada assim que elas adentraram o banheiro vazio. O lugar era enorme e tão luxuoso quanto o resto do salão, com direito a paredes espelhadas e torneiras carregadas de detalhes em pedras e material cor de ouro.

   - Não, Dem. Eu acho que ele está bem. – Comentou Selena se recostando no balcão da pia e levando a mão ao ventre realmente preocupada com a saúde do bebê já que ele era pequenino e precisava que ela ficasse bem para se desenvolver. – Eu acho que estou fraca. Estou sem comer desde o almoço, mas também não sinto vontade.

   - Sel. – Repreendeu-a a olhando e Selena franziu o cenho desviando o olhar. – Você tem que contar para o Ed logo, ele só quer cuidar de você, não percebeu como ele estava preocupado?

   - Eu sei, Dem. Eu vou contar, só me dê alguns dias. – Disse e Demi assentiu porque era a decisão de Selena e ela deveria respeitá-la mesmo não concordando.

   - Então nós podemos pelo menos ir ao hospital para saber como cuidar de você nesses meses de enjoo? Você não pode continuar sem comer. – Cansativo era quando Selena não queria colaborar. Demi deu alguns minutos para amiga e também se recostou na bancada da pia fitando o lustre luxuoso e de luz baixa até que a resposta veio num murmuro esticado e dengoso. – Você tem que colaborar, mamãe, nós só queremos cuidar de você. – Ela sorriu de orelha a orelha abraçando Selena que também a abraçou murmurando um “Aham”. – E você não tem que ficar preocupada com o Jake, ele não pode fazer nada conosco. Me promete que vai relaxar e sair daqui com um sorriso lindo nos lábios? O Ed está preocupado e imaginando coisas que jamais estariam acontecendo. – Colocando uma mecha castanha do cabelo de Selena atrás da orelha, Demi sustentou o olhar da amiga até que ela assentiu.

   - Tudo bem. Eu preciso... – Disse apontando para uma cabine e Demi assentiu rindo observando a amiga caminhar elegantemente até uma daquelas divisórias do banheiro. Suspirando, Demi também adentrou uma das cabines quando sentiu que a bexiga poderia estourar a qualquer momento. Consumir bebidas alcoólicas sempre era um problema.

   - Selena? – Chamou assim que ouviu uma  porta bater. O baque foi estrondoso e brusco que o coração disparou no peito e o sangue pareceu congelar nas veias. – Selena?! – Chamou novamente vestindo a calcinha tão agilmente que a peça ficou mal encaixada ao corpo. O que mais a desesperava era que Selena não respondia e aquilo não tinha como ser um bom sinal bem pelo contrário, era muito ruim.

Continua... E aí? Estão apostando em quem ou no que? Gostaram da gravidez da Sel? Pois é, atentem-se aos detalhes... Obrigada  pelos comentários, um abraço e até mais!

12.11.17

Capítulo 52

Três meses e alguns dias depois...


   - Está frio... muito frio... – Dois graus célsius. Chão e árvores tomados por neve. Céu cinzento. Novembro. Aquele mês maravilhoso era o “aquecimento” para o natal, e então o favorito de Demi. O dobro de turista estava pelas ruas carregadas de neve de Nova York, e o inverno estava lá intenso e maltratando pessoas como Joe que nunca tinha visto um floco de neve de verdade. – Eu estou sentindo minhas bochechas congelarem. – Comentou o rapaz todo duro por conta do excesso de roupa de frio. Por baixo da calça jeans estava uma térmica e uma meia calça. Dentro da bota, os pés estavam protegidos por quatro par de meias. Mesmo com a exagerada quantidade de roupas, o casaco e o cachecol que o agasalhava parecia estar falhando na missão de protege-lo, nem mesmo os dois suéteres estavam ajudando. Um floco de neve tocou a ponta do nariz de Joe e ele olhou para cima a procura do sol, porém só tinha encontrado neve caindo.

   - Nós estamos chegando. – Por que diabos Demi estava tão graciosa vestindo apenas uma muda de roupa de frio, agasalho, luvas e touca enquanto ele parecia um robô todo travado? Quando o vento soprou, doeu na alma e Joe arrumou a touca para que pudesse proteger as orelhas que estavam geladas. – Joseph? – Tudo bem, caminhar na neve não era agradável, porém os múrmuros de Joe eram exagerados. Não estava nem frio perto do que Demi já tinha enfrentado. – Amor, você está péssimo. – Ela comentou o puxando para que pudessem descansar em frente à entrada de um estabelecimento onde também estariam mais protegidos da neve. – Vem querido, me abraça. – Disse gentilmente o envolvendo nos braços e quando Joe a abraçou descansando a cabeça no ombro, a respiração quente junto com os lábios gelados a fizeram sorrir.

   - Eu quero o calor de volta. – Resmungou todo manhoso e Demi riu roçando o nariz ao dele.

   - Estamos em Nova York, só teremos calor por volta de março. Vamos pegar um táxi. – Disse nos lábios dele e os roçou mais algumas vezes aproveitando também para dar selinhos ali.

 Foram três meses maravilhosos. Meses de paz, felicidade e muito amor. Demi estava tão apaixonada por Joe quanto ele estava por ela. Também aconteceram brigas e discussões. Brigas terríveis e violentas, porém não passavam mais de dois dias sem se falar. Um cedia ao outro porque não conseguiam ficar separados por nem mesmo uma noite.

Era de partir o coração assistir de camarote Joe sofrer com a mudança de tempo. Nova-iorquinos como Demi estavam acostumados e conheciam todos os macetes para conseguir viver normalmente na época, já Joe... Ele estava acostumado com um calor de altas temperaturas sendo que as mais baixas mal ultrapassavam os dez graus, então nem mesmo conhecia a neve. Estava sendo custoso se adaptar ao inverno. Quando o táxi parou para pega-los, Demi teve que ajudar Joe a caminhar pela neve amontoada nas extremidades da rua. Não era nada fácil julgando pelo tamanho dele.

   - Eu nunca desejei voltar para o Texas como agora. – Comentou Joe cansado e acomodado no banco de trás do táxi que seguia na direção do apartamento de Ed.

   - Ao menos você está curado do resfriado. – Demi tirou a touca que ele usava para arrumar o cabelo escuro de Joe como ela achava que ele ficava um charme. – Você está se deixando derrotar fácil, caubói. Em janeiro é duas vezes pior. – Disse e Joe arregalou os olhos porque ele não conseguia imaginar mais neve do que tinha visto. Nada tinha escapado! As árvores estavam praticamente congeladas, a neve se acumulava no teto dos carros facilmente e nos monumentos espalhados pela cidade. Ah! E o lago do Central Park estava começando a congelar!

   - Prometo que você vai adorar o campo. – Ele disse tirando a luva da mão direita para poder segurar a mão de Demi também nua. – E tomar banho de cachoeira à tarde. Não temos neve e nem esse frio absurdo.

   - Eu acho que não me adaptaria. – Disse descansando a cabeça no ombro largo. – Estou acostumada com barulho, movimento e conviver com pessoas diferentes. Ficar em um lugar calmo e quente seria estranho.

   - Aposto que você vai se apaixonar. A minha cidade é pequena, mas é um dos lugares mais bonitos que já vi. – Do jeito que ele falava cheio de orgulho e um sorriso no rosto, Demi assentiu animada por vê-lo feliz. Era o que mais importava, fazer Joe feliz da mesma forma que ele a fazia.

O taxista os deixou em frente ao prédio onde Ed morava. Não foi complicado caminhar na neve como tinha sido para entrar no táxi, porém quando adentraram o edifício, Joe fez careta porque estava quente por conta dos aquecedores. Aquela era simplesmente a parte mais chata do inverno: nas ruas fazia frio e nevava, já dentro dos estabelecimentos, prédios e outros, os aquecedores quebravam o frio.

   - Eu estou com calor. – Resmungou Joe tirando o cachecol porque se sentia sufocado. Demi o observou e arqueou uma sobrancelha porque a quantidade de roupa que ele usava era absurda.

   - Eu avisei. – Disse revirando os olhos porque Joe tinha tirado o casaco e pediu que ela segurasse, assim como a touca, o cachecol e as luvas. – Joseph. – Reclamou baixinho fitando o namorado e as pessoas que estavam junto a eles no elevador. Se Joe começasse a tirar os suéteres, ela realmente ficaria constrangida e enciumada como vinha acontecendo com muita frequência.

   - Estou melhor. – Quando ele respirou fundo, Demi esboçou um sorriso ao ver as bochechas coradas por conta dos movimentos que ele tinha feito para tirar as blusas. Nos quatro meses que eles estavam juntos, Demi tinha percebido que toda aquela fofura, vergonha e timidez, não importava o quão íntimos estivessem, era natural de Joe. Assim como também ele era um cavalheiro, gentil, bondoso e extremamente paciente com os surtos dela. – Obrigado por segurar. – Em recompensa Demi teve a bochecha beijada carinhosamente, o que a fez sorrir e de um jeitinho discreto, abraçar o namorado de lado.

   - São raras as vezes que você tem folga, não vamos ficar muito tempo, ok? Eu quero ir para casa aproveitar o nosso tempo. – Tinham acabado de sair do elevador sozinhos. Joe continuava trabalhando como segurança, porém como estava nevando, a empresa o liberou, razão pela qual ele estava de folga já tinha quase uma semana.

   - Tudo bem, não vamos ficar muito. – Ele beijou brevemente os lábios de Demi e a guiou pela mão até que estavam em frente ao apartamento que Ed vivia com os sobrinhos e Selena. – Bebê, você vai ficar bem? – Perguntou carinhosamente a fitando nos olhos antes que batessem à porta.

   - Nós estamos conversando, não como antes, mas é melhor que nada. Vou ficar bem. – Era sobre Selena. O tempo não ajudou a colocar as coisas no lugar, aliás, elas estavam conversando sobre um assunto ou outro, mas nada como antes. Nada das brincadeiras que estavam acostumadas, dos carinhos exagerados e nem mesmo de uma ficar grudada na outra como era de se esperar.

A batida à porta foi leve e soou duas vezes para que então a porta fosse aberta por Selena. Ela sorriu verdadeiramente assim como menininha que estava no colo, Ana, que esticou os braços para que Joe a pegasse. Demi não ficou para trás, Harry, que desenhava sentado ao tapete da sala sorriu animado quando a viu e a puxou para desenhar com ele. Os sobrinhos de Ed eram crianças adoráveis, inteligentes e educadas.

   - Tia Demi, assiste desenho comigo, a mamãe e o Tio Joe? – Demi fitou brevemente Selena que apenas assentiu sem problemas por Ana ter a chamado de mãe. Então ela assentiu fitando os olhos de Ana. Era apenas uma criança de seis anos e ela não sabia dizer não a eles.

   - Vamos Harry, nós podemos desenhar juntos. – Pegar uma criança no colo e interagir era algo novo para Demi. Ela não tinha contato com bebês, crianças e adolescentes, apenas adultos. Os sobrinhos de Ed eram as únicas crianças que ela conhecia, e não havia muito tempo. – O que você está desenhando? – Perguntou carinhosamente para o garotinho colocando uma mexa do cabelo dele atrás da orelha.

   - O Mickey e o Thor. – Demi riu porque eram personagens tão distintos, daí se lembrou de que o não faltava para as crianças era criatividade.  O desenho de Harry era colorido e havia mais personagens, alguns que ela já tinha visto em animações e outros que só existia na cabeça do menino.

   - Viu só? Ele desenha bem melhor que você. – Disse Demi para Joe que estava entretido com Ana e a animação que passava na televisão, e quando ele a olhou, revirou os olhos.

   - Eu também te amo, querida. – Os dois riram e só não se beijaram porque estavam a certa distância.

   - Boa noite. – Ed estava sorridente e foi disputado por Demi e Joe que queriam dar os parabéns para o amigo. Acabou que Joe cedeu e Demi envolveu Ed num abraço apertado e demorado deixando Joe e Selena curiosos com o que ela sussurrava para o aniversariante. Já Joe foi mais discreto, trocou um abraço com Ed, sorriu um pouco envergonhado e desejou os parabéns. – Nós vamos sair para comprar carne, vocês duas vão adiantando o resto da comida. – Selena arqueou uma sobrancelha e Demi mordeu discretamente o lábio inferior.

   - Como nós vamos assar essa carne, Jesse? – Perguntou Selena porque eles estavam num apartamento, não havia espaço e nem lugar para uma churrasqueira.

   - Não se preocupe, eu já pensei em tudo. – Ed sorriu para Selena e ela revirou os olhos já pensando na loucura que o namorado faria. – Só se preocupem em preparar a comida, garotas. Nós dois vamos cuidar do resto. – Demi riu da careta que Joe fez ao olhar as roupas dobradas que ele teria que vestir novamente para enfrentar a neve lá fora.

   - A tia já volta. – Disse Demi a Harry se aproximando de Joe que também tinha deixado Ana para começar a se vestir. – Ei, não precisa vestir tudo. – Ela gentilmente acariciou o peito largo subindo as mãos para o rosto barbado. – Confia em mim, só basta o suéter e o casaco.

   - Eu confio. Só que eu estava congelando lá fora com todas essas roupas, imagina com uma a menos. – Ele murmurou desanimado fitando as peças que teria que vestir. – Também preciso de algo para proteger as minhas bochechas e o nariz.

   - Quando você chegar, prometo dar muitos beijinhos para esquentar. – Eles sorriram e trocaram um rápido selinho. – Longe das garotas, ok? – Joe assentiu sorrindo travesso enquanto se vestia. – Eu estou falando sério! – Murmurou Demi ajeitando o cachecol no pescoço dele e para ameaça-lo, ela apertou um pouquinho para ver Joe arregalar os olhos de susto.

   - Se alguma mulher se aproximar, vou mostrar a minha aliança sem dizer uma palavra e nem olha-la. – Murmurou porque ultimamente era o que Demi dizia para ele fazer.

   - Bom menino. – Ela sorriu e pôs-se na ponta das botas para conseguir ficar mais próxima do rosto dele. – Mais tarde você terá a sua recompensa. – Sussurrou e o beijou no queixo.

   - Ei, vocês dois, parem com isso. – Ed era tão brincalhão que tocou um pouco abaixo da costela de Joe apenas para vê-lo se encolher porque sentia cócegas ali. – A Demi está te dando ordens? – Perguntou abraçando Joe de lado e sorrindo para Demi, que revirou os olhos dando de ombros porque sabia que Ed estava brincando.

   - Onde está o seu casaco? – Ralhou Selena que Ed engoliu em seco fazendo Joe e Demi rirem. – Deus, Eden! Você quer congelar lá fora? – Sel era tão mal-humorada e impaciente com Ed que ela caminhou para o quarto reclamando baixinho das coisas que o namorado aprontava.

   - Pelo menos a Dem não briga comigo o tempo todo. – Joe riu da cara do amigo que acabou rindo também.

   - A Sel também não. É só que ela está para ficar naqueles dias. – Disse e Demi revirou os olhos porque para os homens aquela era a única razão para uma mulher estar brava. – Essa baixinha quase te bateu no restaurante na semana passada. – Comentou Ed se lembrando da noite que eles tinham saído para jantar e Demi teve uma crise de ciúmes porque uma mulher tinha se aproximado de Joe para pedir informação.

   - Eu estou aqui, ok? – Resmungou Demi abraçando Joe porque ela não gostava da ideia de perdê-lo para outra mulher. – Vocês dois ficam tão idiotas quando estão juntos. – Comentou Demi observando Joe e Ed rirem de algo que eles tinham sussurrado um para o outro a excluindo.

   - Não somos idiotas, você que é curiosa. – Ed sorriu para Demi e então voltou a atenção para Harry que tinha o chamado para mostrar o desenho que tinha feito.

   - O casaco, querido. – Selena às vezes podia ser impaciente com Ed, porém tudo que ela queria era que o namorado ficasse bem. – Não demore e tenha cuidado. – Disse a Ed o ajudando a vestir o casaco assim que ele se levantou.

   - Não vou demorar. – Ed a beijou na testa e Joe fez o mesmo com Demi, só que a abraçou apertado aproveitando para beijá-la no pescoço.

Quando Ed e Joe saíram, Demi e Selena suspiraram porque já sentiam a falta deles. Estranho foi quando elas se olharam porque mal se cumprimentaram.

   - Você sabe como o Ed é exagerado. – Comentou Selena se sentando entre os sobrinhos e Demi se acomodou ao sofá ao lado de Ana já que Harry tinha sentado no colo da tia. – Ele quer assar carne para comer com o jantar, comprou um bolo enorme confeitado e me pediu para fazer doces. – Demi sorriu quando Selena também sorriu porque Harry tinha cochichado algo para ela. Se tinha alguém no mundo que seria uma excelente mãe, a mulher era Selena!

   - Ele merece. – As duas sabiam que Ed era um cara incrível e que merecia ser muito feliz. Não era qualquer rapaz que assumia a responsabilidade como a de cuidar de duas crianças mesmo sendo familiares, e ainda continuava sorrindo depois de perder o pai, a mãe e a única irmã. Ed era um cara sozinho, mas com uma imensa vontade de ser feliz que anulava a tristeza que poderia consumi-lo.
Ter crianças por perto ajudava a descontrair e melhorar o ambiente. Por um tempo o desenho na televisão envolveu as quatro pessoas que estavam no apartamento, envolvia mais Selena e Demi que Harry e Ana que brincavam um com o outro. Quase perderam a hora. Selena só se deu conta que estava atrasada para terminar de preparar o jantar quando o desenho animado fez uma breve pausa para o comercial.

   - Você pode olhar as crianças? Vou terminar o jantar. – Demi era tão criança quanto as duas que estavam ali. Os olhos marrons dela estavam vidrados na televisão e ela parecia realmente animada em continuar assistindo desenho. – Dem, vou preparar o jantar. Você fica de olho nas crianças? – Selena perguntou novamente. Ela colocou uma mexa do cabelo que saía do rabo de cavalo atrás da orelha sustentando o olhar de Demi.

   - Fico. – Murmurou Demi se ajeitando no sofá. – Você não vai precisar de ajuda? – As bochechas coraram quando percebeu o que tinha dito. Ajudar Selena significava ficar sozinha com ela na cozinha, o que não acontecia desde o dia que se beijaram há três meses.

   - Vou precisar. – Selena fitou os sobrinhos pensando no que poderia fazer para vigia-los. – Nós revezamos. Uma hora você vem olha-los, noutra eu venho. – Disse e Demi assentiu se levantando com um pouco de preguiça e receio do que poderia acontecer. – Cuida do seu irmão, eu e a tia Demi estaremos na cozinha preparando o jantar. Nós estamos de olho em vocês. – Ana assentiu gostando do tom brincalhão da tia e sorriu quando teve a bochecha carinhosamente selada por Sel. – O Harry me chama de mamãe e chama o Ed de papai. – Disse adentrando a cozinha com Demi ao lado. – Nós concordamos em deixa-lo nos chamar assim, mas sempre falamos da Sophia.

   - É apenas uma criança. Não vejo problema. Infelizmente eles perderam a mãe, mas tiveram sorte de ter você e o Ed para ama-los como se eles fossem seus. Amor, carinho e cuidado de sobra, não fará mal. – Demi não sustentou o olhar demorado de Selena, preferiu fitar as próprias unhas porque estava um pouco envergonhada.

   - Também não vejo problema. – Disse Selena desviando o olhar da amiga para começar a buscar pelos ingredientes que usaria. – Animada para amanhã? – Ela não queria deixar o assunto morrer. Os minutos que ficaram quietas não tinham sido ruins, só era estranho.

   - Sinceramente, nós trabalhamos duro nesses últimos meses para esse evento acontecer, estou cansada. Comemorar o aniversário da empresa será estranho sem o Jason, mas eu vou nem que seja por meia hora. – Demi sentia que não seria uma festa agradável. Ultimamente ela estava sozinha na Gyllenhaal, só havia Ed para visita-la no escritório e Marcus para enchê-la de trabalho extra.

   - Eu também estou cansada. Ultimamente é o que eu mais tenho estado. – Selena se espreguiçou e bocejou logo se escorando na bancada de inox para fitar Demi não muito longe dali. – Acho que é por isso que acabo descontando no Ed. Sorte é que ele tem paciência. – Murmurou a última frase.

   - Você deveria ir ao médico, Sel. Lembra de quando você teve início de anemia? Dava muito trabalho para te tirar da cama e você reclamava de cansaço o tempo todo. – Comentou se aproximando para descascar as verduras que Sel tinha separado.

   - Se não melhorar, eu vou. – Selena fitou os pulsos tatuados da amiga quando ela puxou as mangas da blusa para lavar as mãos. As meninas do departamento comentaram a respeito daquela tatuagem, e como Sel estava distante de Dem, ela mal tinha visto o desenho de perto. – É bonita. – Comentou e Demi franziu o cenho sem entender. – A sua tatuagem. – Disse fitando brevemente os olhos de Demi que puxou mais as mangas porque precisava de mobilidade para cortar as verduras e a roupa a atrapalhava.

   - Obrigada. – Murmurou um pouco envergonhada. – Hum.. – Murmurou quebrando os minutos de silêncio que seguiram, mas não era nada constrangedor e nem desconfortável como tinha acontecido algumas vezes. – Sei que combinamos de fazer juntas. – Disse atraindo o olhar de Selena. – É que eu precisava fazer para me ajudar a continuar tentando ser feliz depois de tudo que passei.

   - Está tudo bem. – Selena sorriu e com muita coragem ela tocou a tatuagem nos pulsos da amiga gentilmente fazendo o coração de Demi bater mais rápido porque ela sentia falta da melhor amiga. – Quando eu for fazer a minha, você pode fazer a sua segunda. – Demi franziu o cenho e riu da piscadela de Sel.

   - Não sei se quero fazer outra. Dói muito.

   - Alguns anos atrás você prometeu que faria a nossa tatuagem. – Selena arqueou uma sobrancelha a olhando e Demi franziu a boca numa linha começando a trabalhar nas verduras.

   - Só mais essa então, não quero muitas. – E como elas tinham combinado, Sel foi verificar se estava tudo nos conformes com as crianças e quando voltou, a conversa não fluiu como elas esperavam e o silêncio acabou prevalecendo.

   - O cheiro está maravilhoso! – Ed e Joe não fizeram barulho e então o susto foi grande. – Não me bate, ok? – Disse Ed percebendo o olhar feio de Selena, nada que ele resolvesse com um abraço e um beijo.

   - Passou muito frio? – Demi secou as mãos e se aproximou de Joe para abraça-lo.

   - Passei. Foi horrível, você não estava lá fora para me aquecer. – Ele disse baixinho a olhando nos olhos e tudo que Demi fez foi ficar na ponta dos pés para conseguir beijar a boca daquele homem. – Mais tarde. – Disse ainda com os lábios roçados aos dela aproveitando também para descer e subir a ponta dos dedos nas costas sugestivamente.

   - Estou ansiosa. – Demi umedeceu os lábios antes de sela-los aos de Joe por mais duas vezes. O coração chegou a bater rápido como acontecia só quando estavam juntos. – Até o dia amanhecer? – Sussurrou o abraçando e encostando a cabeça no ombro largo porque ela gostava de sentir o cheiro suave de Joe.

   - Até o dia amanhecer. – A vontade de Joe era de imprensar a namorada contra o colchão macio da cama e tê-la até que não aguentasse mais, porém nenhum um beijo propriamente dito ele poderia trocar com Demi já que os sobrinhos de Ed tinham adentrado a cozinha. – Sossega, ok? – Advertiu-a a beijando na testa porque ele conhecia muito bem a namorada que tinha. Demi tinha o feito ficar vermelho em público uma série de vezes quando começava acaricia-lo ou quando sussurrava coisas quentes.

   - Sou quase um anjo. – Demi esboçou o melhor sorriso inocente que podia e antes de se virar, deu uma bela olhada lá para baixo fazendo Joe corar, mas também rir discretamente porque ele gostava das brincadeiras que aconteciam entre eles.

   - Um anjo, sei. – Para sussurrar aquelas palavras e acariciar o traseiro de Demi, Joe lançou um rápido olhar a procura de alguém os observando e quando teve a bandeira branca, o fez sem pensar duas vezes deixando Demi com um sorriso divertido nos lábios e as bochechas coradas.

   - Srta. Lovato, com licença, estou roubando o meu melhor amigo. – Estava claro que Ed estava feliz. Demi revirou os olhos quando Joe foi abraçado por Ed. Como eram homens, e homens juntos era sinônimo de imaturidade na cabeça de algumas mulheres incluindo Demi e Selena, eles começaram a trocar socos de brincadeira e Ed ainda abraçava Joe por trás numa espécie de chave de pescoço. Era tão idiota que Demi observou com tédio e Selena revirou os olhos quando os dois finalmente se soltaram rindo e avermelhados. – Vocês duas são chatas. – Resmungou Ed. – E estão tão estranhas. O que está acontecendo? Elas estão estranhas, não estão? – Perguntou para Joe que perdeu toda a animação. Ele olhou para Demi e depois para Selena tenso por elas.

Como nem Demi e nem Selena respondeu, Ed franziu o cenho e teve a atenção desviada para Harry que o chamou para falar que estava faminto.

Foi como voltar à estaca zero. O clima entre Selena e Demi desmoronou drasticamente a ponto delas nem mesmo se olharam, o ponto positivo era que não ficaram sozinhas. Joe e Ed, Ana e Harry. Eles estavam se divertindo cozinhando e brincando como crianças. Comeram à vontade quando o jantar ficou pronto, cantaram um animado parabéns para Ed que chegou a sorrir de orelha a orelha emocionado e apagou as velinhas sobre o bolo com a ajuda dos sobrinhos que o abraçou.

   - Não para. – Joe riu baixinho porque fazer barulho atrapalharia Ed e Selena. As crianças estavam dormindo e os adultos na sala. Cada casal abraçado protegido por uma coberta e num sofá. Na televisão, a primeira temporada de Stranger Things rolava. Estavam no episódio três, porém Demi já estava caindo de sono só porque Joe deslizava a ponta dos dedos no couro cabeludo num carinho de movimentos circulares. – Joseph. – Ronronou se deitando sobre ele e pedindo por um beijo que foi dado de bom grado por Joe que também a segurou levando uma mão a cintura e a outra a bochecha direita.

   - O que foi? – Sussurrou quando sentiu a respiração quente e pesada de Demi contra a orelha. – Amor, eu não entendi. – Disse apenas para ela gentilmente descendo as mãos pelas costas para logo enlaçar os dedos as mexas de cabelo da nuca.

   - Eu estou morrendo de sono. – Sussurrou de volta um pouco envergonhada. Ela não era de ficar com sono quando estava assistindo alguma série ou filme, principalmente quando estava nos braços do namorado. Quem costumava dormir era ele.

   - Tudo bem. – Joe a abraçou quando Demi se aninhou a ele e continuou a deslizar a ponta dos dedos no couro cabeludo dela. – Ed. – Chamou o amigo alguns minutos mais tarde e quando Ed o olhou, Joe tentou não fazer movimentos bruscos quando ergueu o tronco. – Eu vou levar a Dem para casa, ela está com sono.. Hum.. Ela dormiu. – Disse ao perceber como a namorada estava relaxada e agarrada a ele.

   - Vocês podem dormir aqui. As crianças podem dormir na minha cama. – Disse Ed fitando brevemente os olhos de Selena que assentiu saindo dos braços dele para pausar o episódio.

   - Nós temos cobertores e travesseiros de reserva. – Comentou Selena encostando a cabeça no ombro de Ed e fechando os olhos porque ela também estava com sono.

   - Obrigado. Está tudo bem. Vou chamar um táxi e nós vamos para casa. – Tirar as crianças das próprias camas em pleno inverno e estragar a noite de Ed com Selena não estava nos planos de Joe.

   - Vou te emprestar o meu carro, amanhã cedo passo para pegar. – Disse Ed.

   - Se for atrapalha-lo, não tem problema ir de táxi.

   - Fica tranquilo, Joe. Vou arrumar bolo para você e a Demi. – Selena se apressou para caminhar para cozinha e Joe deitou Demi no sofá para que pudesse acorda-la. Costumava dar trabalho acorda-la, e foi estranho quando Demi abriu os olhos e murmurou algo quando Joe a chamou pela quarta vez.

***

O frio não estava sendo um problema, bem pelo contrário. Era muito bom porque Joe podia dormir agarrado a Demi e ela a ele dentro dos moletons largos debaixo de duas cobertas pesadas ainda com o aquecedor do quarto ligado. As persianas da janela impediam completamente que a luz da noite e quando mais tarde a do dia amanhecendo invadisse o quarto, então o sono foi contínuo e delicioso que quando Joe acordou por volta de oito da manhã, ele se sentiu descansado e disposto. Por minutos o rapaz ficou abraçado a namorada de olhos fechados sentindo o corpo quente excita-lo num sentido diferente do sexual, Joe se sentiu feliz e realizado por ter Demi. Pensando em agrada-la, ele se levantou com certo custo, organizou-se no banheiro e partiu para cozinha onde encontrou Lucy.

A cadelinha estava bem cuidada e grande, deveria ter crescido cerca de seis a dez centímetros naqueles três meses. A cada dia que se passava Lucy perdia mais o ar de filhote e Joe se sentia angustiado como um pai que presenciava a sua garotinha crescer num piscar de olhos sem poder aproveitar aquela fase mágica da infância por completa.

   - Não vai pular na.. mamãe. – Muito tarde. O plano era abrir a porta do quarto sem fazer barulho e entrar cuidadosamente para não derrubar a bandeja onde estava o café da manhã. Ele acordaria Demi gentilmente, distribuindo beijinhos pelo rosto e a chamando por apelidos carinhosos, porém Lucy quase o derrubou quando ele abriu a porta do quarto e ela correu para cama pegando impulso para pular com tudo sobre Demi e começar a acorda-la com lambidas no rosto e batendo a pata desengonçadamente. – Lucy! – Joe a repreendeu depois de deixar a bandeja sobre o criado-mudo para controlar a pequenina. – O que eu já disse sobre pular na cama? – Disse fitando os olhos cor de mel de Lucy. Ele tinha a pegado no colo e a colocado no chão logo em seguida, e ela latiu enciumada quando Joe se sentou a beirada da cama. – Se você continuar chata, o papai vai te colocar para fora do quarto e o bebê não vai ganhar biscoito. – Coisa que Lucy iria entender... Joe sustentou o olhar dela e a acariciou no torso. – Ei, acorda. – Até o tom da voz mudava. O coração acelerou um pouco e a respiração ficou pesada. – Demi, acorda. – Os dedos roçaram o queixo marcado e acariciaram a bochecha esquerda. Será que toda mulher era bonita como a dele? As sardas na região dos olhos e nariz, as curvas bem desenhadas do rosto, as bochechas rosadas e os lábios avermelhados. Joe se curvou para depositar um selinho na boca dela sobre o choro de Lucy. – Bom dia meu amor. – Ele sorriu de orelha a orelha porque Demi tinha acabado de se mexer e abrir os olhos como se o beijo dele a despertasse do sono profundo como nos contos de fada.

   - Bom dia. – Demi sorriu sonolenta quando Lucy apoiou as patinhas na cama colocando a cabeça entre elas para olha-la com aqueles lindos olhos castanhos carentes. – Bom dia menina. – Disse a cadelinha a acariciando atrás das orelhas e Lucy ficou tão feliz que não parava de balançar o rabo.

   - Ela já subiu na cama e te lambeu, amor. Sorte é que seu sono é pesado. – Joe sorriu para Demi que sorriu de volta se erguendo com muita preguiça. – Você dormiu bem? – Perguntou cobrindo a mão dela com a dele e Demi assentiu sorrindo.

   - E você? – Uma mão estava envolta pela de Joe e a outra com os dedos enlaçados nos pelos de Lucy.

   - Muito bem. – Eles se olharam mostrando como estavam apaixonados. – Eu fiz o café da manhã. – Disse nos lábios dela ainda a olhando nos olhos e Demi apenas encostou os lábios nos dele.

   - Você adivinhou. Eu estou faminta. – Demi corou, sorriu levando as mãos ao rosto de Joe para acaricia-lo conforme ele distribuía selinhos nos lábios e nas bochechas.

   - Está aqui na bandeja. Vamos comer? Se esfriar vai ficar ruim.  – Demi arqueou as sobrancelhas quando viu o café da manhã. Joe tinha caprichado, tinha ovos com bacon, biscoitos, panquecas, torradas com geleia, iogurte e misto.

   - Só vou ao banheiro. – Ela o encheu de beijinhos e correu para o banheiro deixando Joe com um sorriso no rosto, e se não fosse Lucy para desperta-lo para realidade, ele teria continuado ali sentado alheio ao mundo pensando em como Demi o fazia feliz.



   - Ei, a ponta do seu nariz está suja de geleia. – Demi franziu o cenho e tentou focar o olhar na ponta do nariz, mas acabou resultando uma careta engraçada que arrancou uma gargalhada de Joe. – Deixa que eu limpo. – Ele pegou um guardanapo e rapidamente limpou a geleia de cor roxa da ponta do nariz e também do queixo que acabou sujando.

   - Obrigada, querido. – Para agradece-lo, Demi se esticou para conseguir alcançar a bochecha de Joe depositando um beijo demorado ali que o deixou todo vermelho. – O café da manhã está uma delícia. – Eram tantas variedades, Joe tinha organizado a bandeja sobre a cama e ainda buscou por leite e café na cozinha. – Tem planos para hoje? – Perguntou dividida entre fitar o iogurte e os olhos de Joe.

   - Além de acompanha-la a festa da Gyllenhaal, não. – Comentou jogando um pedacinho de torrada para Lucy. – Possa ser que o Sr. Potter ligue pedindo alguma coisa, eu realmente não sei. – Não era bom ficar em casa, pois a cada dia que Joe não trabalhava na madrugada era descontado no salário que já não era muito.

   - Eu não quero ir. – Organizar a festa da Gyllenhaal deu muito trabalho, e para o padrão da empresa, seria elegante e luxuosa, uma festa que daria o que falar no dia seguinte. – Não estou confortável com essa festa, tantas pessoas importantes estarão lá. Já posso sentir o olhar de cada uma delas sobre mim. Eles sabem sobre o Jake, todo mundo sabe... É tão constrangedor. – Há quanto tempo Joe não ouvia aquele nome? Foram realmente três meses de pura paz sem Jake ou Dianna para atormentá-los.

   - Eu vou estar lá com você. A Selena e o Ed também. – Disse Joe levando a mão livre a dela. – Nós ficamos isolados dos demais, podemos sair mais cedo e comer alguma coisa na rua. – Sugeriu e Demi deu um jeito de ir para os braços dele a busca de proteção.

   - Não fala da Selena. Eu sinto tanta a falta dela, amor. – Murmurou tristonha e Joe se recostou a cabeceira da cama esticando as pernas para ficar mais confortável para ele e Demi. – Ontem foi o dia que nós mais conversamos desde.. você sabe. – Mesmo chateada com a situação Demi não deixou de continuar comendo.

   - Gatinha, por que você não fala com ela? – Ele perguntou levando uma mão para acariciar abaixo do umbigo de Demi também aproveitando para comer um misto. – Tenta se aproximar, ela também sente a sua falta. O Ed comentou que ela está diferente nesses últimos dias. Anda estressada, impaciente e ele a pegou chorando algumas vezes. – Demi arregalou os olhos quando fitou os de Joe. Para Selena estar daquele jeito, algo realmente sério deveria ter acontecido.

   - Ele sabe sobre nós duas? – Perguntou tão baixinho e vermelha de vergonha.

   - Não. Relaxa, ok? Não vou te julgar por isso. – Ele a beijou na bochecha e a abraçou repousando a cabeça no ombro dela. – Se eu te perguntar o porquê que vocês se beijaram, você vai ficar chateada?

   - Não.. – Murmurou incomodada se ajeitando nos braços dele e desistindo de terminar o iogurte. – Eu nunca fiquei com uma garota e nem pretendia ficar. – Começou a dizer alimentando Lucy com o resto do misto. – Eu e a Sel sempre fomos íntimas. Nossa amizade nasceu tão naturalmente quando ainda erámos meninas. Não temos segredos, nos protegemos e temos ciúme uma da outra. Nós gostamos de trocar carinho, dormir de conchinha usando apenas lingerie, comentar em detalhes sobre os garotos que nós pegamos e fazer planos para o futuro. – Ela sorriu se lembrando dos melhores momentos ao lado de Selena, de como era bom fazer a amiga sorrir e protege-la dos rapazes que queriam apenas usa-la. – Ent..

   - Espera. – Joe coçou a nuca e piscou algumas vezes tentando absorver as informações. – Vocês dormem na mesma cama usando apenas lingerie? E de conchinha? – Ele perguntou e Demi assentiu rindo.

   - Não é sempre de lingerie ou de conchinha, mas nós dormimos agarradas. – Disse naturalmente. – Posso continuar? – Perguntou o olhando e Joe mordeu o lábio inferior logo arqueando a sobrancelha esquerda.

   - O que você disse sobre mim para ela? – As bochechas dele estavam coradas! Demi sorriu de orelha a orelha e se virou para beija-lo na boca e aperta-lo nos músculos grandes dos braços.

   - Ah. Que eu me lembro, falei que você é muito gostoso. E que é muito bom dormir com você porque você é quente e não fica mexendo. – Demi esboçou um sorriso levado e o beijou no maxilar esquerdo. – Que você é muito bonito sem roupa e que.. Como posso falar isso sem que as suas bochechas fiquem ainda mais vermelhas? – Pirraçou-o e Joe desviou o olhar porque estava com vergonha. – Joseph! – Ela riu se virando para abraça-lo. – Eu disse que você é um amor, ok? – Joe assentiu sustentando o olhar dela e Demi o beijou nos lábios. – E que ele é muito gostoso em todos os aspectos, amor. – Demi tornou a rir porque ela tinha levado a mão ao membro dele para aperta-lo.

   - Demi. – Tinha como ele ficar mais sem graça? Joe desviou o olhar da namorada para encontrar Lucy que tinha dado um jeito de comer o resto do café da manhã por eles.

   - Estou falando sério, ok? – Disse risonha levando a mão que apertava o membro para a coxa direita de Joe já que ela estava deitada entre as pernas dele. – Ele só é um pouquinho exagerado, mas não é nada que eu não possa me acostumar. – Demi riu alto quando Joe murmurou um “Jesus” todo sem jeito com o comentário. Era divertido faze-lo passar vergonha. – Você não contou nada sobre o meu corpo para o Ed? – Perguntou curiosa se acomodando a cama com a cabeça escorada no abdômen de Joe.

   - Não. Não falamos de você e nem da Sel dessa forma.

   - Vocês não falam de sexo? – Perguntou o acariciando nos joelhos e Joe suspirou porque Demi era impossível, ela ainda tinha aquele sorriso levado nos lábios e o olhava nos olhos.

   - Dem, deixa de ser curiosa. – Mesmo com as posições completamente diferentes, Joe se curvou e depositou um selinho demorado nos lábios dela. – Tudo bem, não faz esse biquinho. – E ele o mordeu e mimou a namorada com beijos pelo rosto. – Nós só conversamos sobre as nossas posições favoritas e do que gostamos na cama. Nada muito detalhado. – Comentou corado e Demi sorriu se erguendo para abraça-lo.

   - Querido, leva essa bandeja para cozinha e coloca a Lucy para brincar lá fora. – Joe sorriu assentindo e beijou os lábios de Demi a abraçando forte contra o corpo. – Estou esperando você. – Sussurrou no ouvido dele e deu um pouquinho de trabalho, mas Joe conseguiu se levantar descabelado e corado por conta dos beijos que tinha trocado com Demi. Já ela sorriu porque Joe era apaixonante. Ele chamava Lucy todo carinhoso e gentil para fora do quarto e tinha organizado o que tinham sujado na bandeja.

Para não atrapalha-los, Demi organizou os travesseiros na cama, empurrou as cobertas para extremidade direita do colchão e caminhou para o banheiro. O cabelo não estava ruim, ela o penteou com os dedos e como estava incomodando, os prendeu num coque que sabia que não duraria muito já que Joe o desmancharia, ele sempre o fazia.

   - Dem? – A voz de Joe sempre era suave quando ele dizia o nome dela. Demi mordeu o lábio inferior e saiu do banheiro se sentindo estranhamente ansiosa. – Ei, eu adoro dormir com você, mas hoje foi tão especial. – Joe tinha a puxado para os braços e sorriu fitando os olhos marrons que tanto amava.

   - Por que foi especial? – Ficar na ponta dos pés para conseguir alcançar o queixo dele era trabalhoso, mas Demi não desistiu tendo uma pequena ajuda de Joe que se curvou para que ela pudesse beija-lo na boca.

   - Sempre é. Hoje eu acordei tão bem. Estou feliz, Dem. – Disse a olhando nos olhos.

   - Eu também estou feliz. – As mãos de Demi eram delicadas e tinham o toque suave. Estavam espalmadas no tecido de algodão do moletom sobre o peito largo e ali faziam carinho. – Tem quatro meses e uma semana que nós estamos juntos, e sinceramente, foram os melhores dias de toda a minha vida.

   - Amor, eu finalmente me sinto vivo e parte desse mundo. E é por sua causa. – As mãos dele desmancharam o coque, apertaram-na pela cintura e foram cuidadosamente repousadas nas costas por debaixo da roupa. O olhar estava fixo ao dela e o coração batendo no mesmo ritmo. Joe não se sentia diferente do que tinha dito a Demi e não tinha exagerado para impressiona-la. Depois que a conheceu, a vida finalmente começou a fazer sentido e a vontade de viver para estar nos braços da mulher que amava o motivava a querer ser alguém melhor para Demi e para o mundo.

   - Você é um homem especial, Joseph. – Ela sorriu emocionada fitando os olhos dele. – O mundo não merece toda sua bondade, inocência e gentiliza. E eu tenho tanta sorte de te ter. – Não precisavam trocar as três palavrinhas. A eletricidade que os envolviam e os olhares que trocavam era o suficiente para que soubessem que se amavam de toda alma e de todo coração. – Me sinto completa, amada e pronta para viver toda a minha vida com você.

Joe não precisava de mais nada. O corpo desejava o dela a ponto de as mãos estarem tremulas e o resto dele sensível ao toque. A forma que a beijou foi um pouco brusca, mas conforme a língua tocava a dela sentindo o gosto suave, as mãos apertavam as curvas do corpo e o calor de Demi o envolvia, o beijo se tornava mais lento, delicioso e um catalisador perfeito.

As mãos abraçaram o traseiro feminino e ela enlaçou as pernas na cintura dele quando foi impulsionada. A deita-la na cama, Joe a encostou na parede e por minutos a beijou e a acariciou também sendo acariciado.

Demi estava ofegante, um pouco zonza e apaixonada. Quando os lábios de Joe não estavam sobre os dela, os seios eram beijados mesmo sobre o moletom e o pescoço era constantemente atacado sendo mordiscado e beijado.

Ali na parede não duraram muito, Joe os levou para cama e quando eles se separaram, estavam ofegantes e ansiosos. Demi tirou o moletom que vestia junto com a camisa, desabotoou o sutiã e partiu para cima do namorado para beija-lo na boca, arranha-lo no abdômen, aperta-lo no músculo dos braços, no membro e traseiro. Ela era selvagem! Joe acabou sorrindo e aos poucos conseguiu controla-la, invertendo as posições que estavam deitados assim ficando por cima. A camisa foi despida o deixando nu da cintura para cima só depois que os mamilos marrons foram chupados e os seios beijados até que estavam levemente rosados e a dona deles de olhos fechados e gemendo baixinho.

Pele sobre pele. Demi tinha o cenho franzido porque as mãos estavam imobilizadas pelas grandes de Joe acima da cabeça, e por conta das duas calças de moletom que ele vestia, ficava impossível de sentir o membro a roçando como geralmente acontecia. Os beijos dele foram retribuídos com mais desejo, os pés ajudaram a abaixar as calças de Joe e quando ele interrompeu o beijo para ficar de joelhos entre as pernas dela para tirar as calças e cueca, Demi abaixou as calças dela e a calcinha tudo de vez desesperada para tê-lo. E daquele mesmo jeito Joe uniu o corpo ao dela: A calça dela embolada nas canelas e as dele nos pés. Foi engraçado e eles riram se organizando antes de começarem a se mover. Joe por cima segurando uma mão de Demi acima da cabeça enquanto a outra tratava de apalpar a coxa esquerda. Já ela tinha os lábios entreabertos, o cenho franzido conforme sentia o membro a preenchendo e esvaziando vagarosamente, e os pés no ar e os joelhos dobrados.

   - Um pouco devagar. – A voz soou num fio quando Joe acelerou o movimento. Os olhos marrons estavam arregalados e as bochechas coradas. Demi fechou os olhos e empurrou um pouco o namorado pelo peito. – Não tão rápido. – Reclamou quando ele a olhou.

   - Desculpa, bebê. – Ele era um amor! Demi se sentiu especial quando Joe a beijou na testa logo repousando a dele ali e como ela tinha pedido, ele tratou de se concentrar em se mover devagar, toca-la nas mechas do cabelo e nos mamilos, deslizar as pontas dos dedos pela extensão dos braços e beija-la com carinho no pescoço. – Gatinha, puxa a coberta. – Pediu porque agora quem estava por cima era Demi. Ela assentiu puxando a coberta como ele tinha dito e o abrigou no calor entre as pernas da forma que gostava, se deitou sobre Joe e vez os lábios beijavam o queixo barbado e vez os lábios dele.

***

   - Eu estou falando sério, é para você escolher. – Há quanto tempo aquela conversa estava rolando? Joe começava a se sentir cansado e Demi sem jeito. Estavam sentados num dos bancos espalhados pelo shopping Center. Ir ao cinema e almoçar na praça de alimentação foi uma ideia complicada de se executar, porém tudo tinha corrido bem até que tocaram naquele assunto.

   - Joseph, sério, obrigada, mas eu tenho vários vestidos que nunca usei. – Ela não tinha o olhado nos olhos, olhava as poucas pessoas que caminhavam naquele corredor e quando teve coragem para fitar os olhos de Joe, corou porque ele estava sério e consequentemente mal-humorado. O verde dos olhos chegava estar escuro.

   - Qual o problema? Eu não posso querer comprar um vestido para a minha mulher? – Perguntou irritado levando a mão à coxa de Demi protegida pela calça jeans.

   - A ocasião não vale a pena. – Tentou argumentar e para descontrair o clima, deu um selinho nos lábios dele e arrumou o cachecol ao pescoço logo acariciando a barba.

   - Eu quero comprar um vestido para você. – Insistiu sério e Demi se sentiu mal por deixa-lo irritado.

   - Eu não quero que você faça gastos desnecessários. – Comentou corada. O trabalho de segurança não pagava muito bem, e com a última nevasca Joe tinha sido dispensado, então ele não receberia. A escola pagava pouco mais que a metade de um salário. Não estava fácil, depois que pagava as despesas básicas, sobrava um pouco de dinheiro que era dividido: metade para o carro que ele queria comprar e metade para gastar com Demi e Lucy.

   - Amor, é um presente. Eu quero muito que você vá com uma roupa que eu te dei. Não tem nada de errado, você pagou a minha consulta no mês passado, por que eu não posso agradecer com um presente? – Demi franziu o cenho, mas assentiu. Ela não discutiria com Joe porque quando ele colocava uma coisa na cabeça, era difícil de tirar.

   - Tudo bem. – Cedeu e de tão feliz que Joe ficou, ele a beijou no queixo e logo na boca. – Você vai me ajudar escolher? – Perguntou puxando o cabelo curto da nuca entre os dedos.

   - Vou! – O tempo que passaram juntos namorando pela manhã não serviu de muita coisa já que o desejo continuava o mesmo, e um pouco mais forte. Como estavam em público, Joe se controlou para não levar uma mão aos seios ou ao traseiro.

Quatro lojas. Era o bastante para Demi ficar estressada com a situação. Na primeira, o vendedor praticamente a sufocou. Ele não parava de sugerir vestidos e não dava espaço. Na segunda, a vendedora estava mais interessada em Joe a atende-la como deveria. A terceira loja era uma decepção, o atendimento não era ruim, porém o produto não era muito agradável e o preço um absurdo!

   - Dá uma volta. – Finalmente um lugar agradável. Era o terceiro vestido que Demi experimentava, e como ela não tinha gostado muito do que estava vestida, sobrou apenas as duas peças que estavam repousadas no braço da vendedora que servia de cabide . – A Srta. Vai experimentar qual? – A moça deveria ter a mesma idade que Demi. Era baixa, morena e tinha cabelos negros cumpridos. Optando pelo vestido preto, Demi acenou para Joe antes de adentrar o vestuário.

Não deu muito trabalho para vestir a peça, ela só estava com um pouco de vergonha porque Joe tinha deixado marcas: uma na curva do maxilar abaixo da orelha e a outra no lado direito do mamilo esquerdo. O modelo do vestido era diferente dos que Demi costumava usar. Na frente as alças estavam cruzadas e envolviam o pescoço. Batia acima dos joelhos e ficava colado nas coxas.

   - Como está? – Ela corou com o olhar da vendedora e o de Joe, e quando se aproximou, segurou a mão do namorado que a girou.

   - Está linda. – Joe comentou com um sorriso discreto nos lábios. – Vai experimentar o outro? – De tão carinhoso que ele era, Joe colocou uma mexa do cabelo longo atrás da orelha e acariciou a bochecha rosada.

O outro vestido ficou tão bom quanto o preto, e no final Demi estava indecisa em qual poderia comprar. Joe a ajudou, escolheu a peça que ele gostou mesmo ela sendo cinquenta dólares mais cara que o vestido preto e com um sorriso no rosto ele pagou e saiu da loja satisfeito segurando a mão de Demi e as demais sacolas.

   - Quer um sorvete? – Perguntou o rapaz. O quiosque estava vazio mesmo que as imagens dos sorvetes que passavam no painel eram de dar água na boca. Demi franziu o cenho e negou prontamente.

   - Está nevando lá fora. – Disse fazendo uma senhora careta e Joe riu a abraçando de lado e a beijando na testa. – Nós já comemos, fomos ao cinema, compramos chocolate, você comprou um vestido. Está na hora de encerrar a nossa aventura no shopping, não acha?

   - Está divertido. – Ele disse sorridente deixando que Demi o abraçasse pelo pescoço e se esforçasse para conseguir beija-lo no queixo. – Você é tão baixinha. – Comentou a envolvendo nos braços e se curvando para beija-la na boca.


   - Acho que você é que é grande demais. – Demi sorriu nos lábios dele e os beijou logo em seguida. – Vamos só dar uma volta, ok? Precisamos ir para casa. – A resposta foi um beijo, Demi não entendeu muito bem, e não fazia questão. Abriu um pouco mais os lábios e participou ativamente do beijo, juntando a língua a dele e enrolando as mechas curtas do cabelo da nuca nos dedos.

    - Gatinha, amo você. – Demi sorriu enquanto recebia o beijo na testa e era abraçada calorosamente por Joe.

   - Também amo você, grandão. – Trocaram apenas um selinho que foi demorado e cheio de vida. Separaram-se segundos depois um sorrindo um para o outro e se abraçaram como os melhores amigos que eram.

   - É destino, só pode! – Joe sorriu para Ed e desfez do abraço com Demi para abraçar o amigo. Já ela fitou Selena de bochechas coradas, mas cumprimentou a amiga com um estranho abraço e um sorriso igualmente forçado. – Vocês estão indo embora? – Ed perguntou animado.

   - Nós iríamos dar uma volta e ir embora. – Disse Joe enlaçando os dedos aos de Demi. – E vocês?

   - Nós chegamos deve ter quase uma hora, certo amor? – Perguntou para Selena que assentiu o abraçando de lado. Ela estava tão quieta e fechada que Demi estranhou. – Vocês se importam se nós fossemos olhar os notebooks? – Demi deu de ombros e Selena assentiu de cenho franzido.

Joe e Ed não conseguiram engloba-las a conversa. Não era por falta de conhecimento, o clima estava fechado entre as duas e Selena não parecia nada bem. Joe não queria deixar Demi na mão, ele fez de tudo para conseguir ficar ao lado dela, porém chegou num ponto que não deu para evitar, Ed o puxou pelo abraço em direção ao balcão onde os notebooks estavam expostos e não parou de falar por um minuto.

   - Está tudo bem? – Demi perguntou incomodada sustentando o olhar de Selena. Ela parecia com raiva ou estava irritada.

   - Eu posso me arrumar no seu apartamento? – Demi não esperava por aquilo, e então não soube o que poderia dizer, mas acabou assentindo. – Eu preciso muito conversar com alguém. – Selena não estava bem. Dificilmente ela ficava quieta quando estava no shopping e deveria ser a primeira vez que Demi a via usando roupas simples fora de casa. Sel costumava se arrumar nos padrões de moda e tudo mais, sempre estava impecável e maquiada.

   - Você está me deixando preocupada. – Disse Demi e Selena desviou o olhar e caminhou até que estava perto de Ed deixando Demi sozinha e confusa.

Depois do que aconteceu na loja de notebooks, Demi não estava mais focada na situação estranha com Sel. Ela só conseguia pensar no que tinha acontecido com a amiga e no porquê do comportamento estranho. Selena tinha se fechado até mesmo para Ed. Era preocupante.

   - Obrigado pela carona. – Disse Joe a Ed, mas demorou para ele entender o que o amigo dizia já que o olhar estava fixo em Selena. Ela não tinha dito uma palavra sequer desde que saíram do shopping. Estava quieta e de olhos fechados com a cabeça encostada no vidro da janela da porta do carro.

   - Por nada. – Resmungou Ed de cenho franzido e fitando Demi na esperança que ela fizesse alguma coisa.

   - Selly. – Demi a chamou cheia de receio, e quando Selena se ergueu para olha-la, ela parecia cansada e abatida. – Você.. Você quer que eu vá a sua casa ou você vem ao meu apartamento? – O receio era tanto que Demi mordeu o lábio inferior e colocou uma mecha do cabelo atrás da orelha nervosa com a situação.

   - Eu venho para cá daqui a pouco, só vou em casa tomar um banho. – O sorriso forçado melhorou a situação, porém Selena parecia nem se importar.

   - Estarei esperando. – Que situação! Demi trocou outro olhar com Ed que engoliu em seco preocupado e com medo do que poderia ser. Não havia muito o que ser feito. Demi e Joe saíram do carro e acenaram quando Ed buzinou. – Ela não está bem. – Comentou de cenho franzido e Joe a guiou para dentro do prédio porque ele não suportava ficar exposto a neve.

   - Ela não está. – Ele disse se livrando do cachecol e da touca. – Vocês vão se arrumar juntas, então já é um começo para saber o que está acontecendo. – Demi assentiu, mas no fundo tinha medo de descobrir do que se tratava. – Amor, e.. – Antes que ele pudesse terminar, o celular começou a tocar e Joe o atendeu no último toque já que as luvas não facilitavam a entrada da mão no bolso da calça e nem que ele segurasse o aparelho.

Sim, não. Não, sim. Era do trabalho. Demi acenou para o recepcionista, fitou as pessoas entrando no elevador e as que adentravam o prédio. Foi o tempo suficiente para Joe conversar no celular.

   - Demi, eu tenho que ir. O Sr. Potter está na porta do meu apartamento. Ele precisa da minha ajuda no sítio e com algumas entregas. – Demi franziu o cenho e abraçou o namorado toda manhosa.

   - Ah não, Joe. – Resmungou franzindo os lábios num biquinho e Joe a abraçou e beijou os lábios dela.

   - Ah não, Joe. – Ele a imitou enquanto distribuía beijinhos no rosto dela e Demi revirou os olhos emburrada. – Não seja egoísta, ok? – Ele iria apanhar! Joe riu da careta dela e de quando Demi tentou se soltar dos braços dele sem sucesso. – Estou brincando bebezão. Vou tentar ser o mais rápido possível, ligo quando terminar.

   - Você é um chato. – Reclamou o abraçando com força como se ele fosse um enorme ursinho de pelúcia, e Joe sorriu a abraçando de volta. – Tenha cuidado, ok? Você vai à festa, certo? – Perguntou manhosa e Joe assentiu beijando o biquinho dela.

   - Vou tentar. Mas não sei que horas vou terminar. – Era melhor falar a verdade, ele não sabia quanto demoraria com as entregas e nem mesmo o que deveria ser feito no sítio. – Eu não vou mentir para você. – Disse quando Demi o olhou feio. – Dem, da última vez que fui ao sítio, demorou muito porque o Sr. Potter precisava de ajuda com os animais, era no começo dessa neve toda. Agora que está nevando pra valer, pode ser sério. Cuidar de vacas, cavalos e galinhas exige muito tempo. – Explicou-se e Demi assentiu com muito custo.

   - Eu já disse que odeio o Steve? – Resmungou e Joe riu. Ela não odiava o Steve, Sr. Potter, estava longe de odiá-lo. Eles já tinham saído juntos algumas vezes e foi muito divertido. – Se puder, explique para ele que você precisa me acompanhar na festa da Gyllenhaal, Joe. Eu estou preocupada com a Selena, e ao mesmo tempo morrendo de medo do porquê de ela estar toda estranha. Se as coisas piorarem agora no final da tarde, com quem eu vou ficar na festa?

   - Vou tentar. – Ele disse a olhando nos olhos e forçando um sorriso para desmanchar a careta de Demi. – Então eu já vou. Tchau gatinha. – Era daquele jeito em todas as despedidas. Demi ficava emburrada e ele de coração partido porque geralmente era sempre ele quem tinha que ir. – Eu amo você.

   - Joe... – Ronronou manhosa o abraçando e tentando convencê-lo de não ir com o melhor olhar de cachorrinho que caiu da mudança, mas não tinha jeito. – Eu também amo você. – Ronronou novamente e Joe a beijou na boca brevemente e sorriu para ela.

   - A gente se vê mais tarde, ok? – Disse entregando as sacolas para ela e Demi assentiu triste. – Não faz essa cara, nós trocamos mensagens, ok? – Quando ela assentiu novamente triste, Joe a beijou na testa e envolveu os dedos da mão direita livre dela com os dele. – Tchau amor. – O “tchau” que Demi murmurou foi tão manhoso que Joe teve que beija-la na boca novamente arrancando um pequeno sorriso dela. E para que ela soltasse os dedos dele? Joe sorriu enquanto a olhava, e Demi só soltou a mão dele quando os braços estavam esticados por conta da distância.

Olharam-se até que Joe saiu do prédio esbarrando em algumas pessoas e quase se colidindo contra a porta de vidro, seria engraçado se não fosse trágico. Ele ficou envergonhado, ainda mais quando Demi riu e disse um mudo “Eu amo você!”. Enfrentar a neve foi um desafio difícil. Às vezes Joe afundava o pé protegido pela bota num montueiro branco de gelo e se desequilibrava. Demi não estava lá para ajuda-lo, e ele teve que ter muito jogo de cintura para atravessar a rua e andar normalmente como as outras pessoas. A sorte era que o apartamento dele não era longe, pois se fosse, Joe pegaria um táxi. Como tinha dito, Steve estava o esperando na caminhonete em frente ao apartamento, e ele riu de como Joe estava empacotado e atrapalhado.

   - Você precisa de ajuda, rapaz? – Perguntou com aquele típico ar divertido e Joe negou de bochechas coradas. – Quer comer antes de nós sairmos? Tem muito trabalho no sítio.

   - Eu estou bem. Estava com a Demi, nós comemos no shopping. Só tenho que alimentar a Lucy. – Explicou-se adentrando o prédio porque ele não gostava de ficar exposto a neve. Joe sentia tanto frio que chegava a doer nos ossos.

   - Você deveria comer, Joe. – Joe engoliu em seco porque Steve estava sério. Ele o olhava como um pai preocupado e bravo com o filho teimoso. – Você contou para garota que tem ficado tonto e desmaiou duas vezes nesses três meses?

***

Era horrível ficar longe de Joe. Ultimamente eles estavam passando tanto tempo juntos que Demi não conseguia mais pensar no que poderia fazer sozinha. Quando Joe sumiu de vista, ela respirou fundo e franziu o cenho. Ela gostava muito de ficar com Joe, ele era um bom namorado e o melhor amigo que uma mulher poderia ter.

   - Srta. Lovato, boa tarde. – O recepcionista a chamou e Demi se aproximou do balcão esboçando um sorriso educado. – Antes da Srta. chegar, uma mulher tentou subir, mas foi barrada na portaria. Ela disse era que a sua mãe, e insistiu que entregássemos esse envelope. – Dianna. Era claro que era ela. Demi fitou o envelope nas mãos do recepcionista sentindo o coração bater mais rápido só de pensar no que teria ali dentro.

   - Eu vou ficar com o envelope. – Disse um pouco incerta se queria mesmo se envolver com Dianna novamente. Três meses se passaram e desde então, ela estava distante de Dianna e até mesmo de Inácio que tentou contato algumas vezes. – Se ela aparecer novamente, não a deixe subir. – Era o certo. Dianna tinha a magoado e Demi tinha decidido que não queria pessoas como a mãe para lhe tirar a paz. – Só o Sr. Jonas, o Sr. Metcalfe e a Srta. Gomez têm permissão para subir, os demais não sem me consultar.

   - Como quiser. – Demi forçou um sorriso e com um educado boa tarde se dirigiu ao elevador e esperou ansiosamente que as portas dele fossem abertas. Ela estava nervosa e com tanto medo do que tinha naquele envelope. Não havia nada escrito, era de um branco puro e impecável.

Demorou minutos a fio para que o elevador chegasse, e quando as portas dele foram abertas no hall, Demi se perguntou como tantas pessoas compartilharam o mesmo espaço. O único defeito daquele prédio era mesmo o maldito elevador, o resto era agradável. A subida até o andar onde morava não foi turbulenta, bem pelo contrário, o elevador estava vazio e Demi cada vez mais ansiosa. Procurar a chave na bolsa deu trabalho, mas quando a encontrou, o apartamento foi destrancado às pressas e a luz da sala acesa. Demi trancou a porta e tirou as botas antes de pisar no tapete felpudo deixando as sacolas e a bolsa nele para que pudesse se deitar no sofá.

O que diabos tinha dentro do envelope? Ela o aproximou do nariz e absorveu o cheiro do perfume de Dianna de olhos fechados. Por que não poderia ser diferente? Tudo era complicado e traiçoeiro. Dianna vivia mentindo e Demi não sabia mais no que acreditar. Será que ela deveria abrir o envelope? Será que o que estava ali dentro iria desestabiliza-la? Demi cheirou mais uma vez o papel impecável e pensando nas últimas considerações em relação à mãe, que ela o abriu.

Um papel dobrado num retângulo perfeito e junto, três fotografias. A dor no peito já era um fato, os olhos estavam marejados e o lábio inferior foi mordido com força. A primeira fotografia estava integra, parecia que nunca tinha sido tocada, nem mesmo havia a marca de digitais no papel fotográfico. Demi umedeceu os lábios e sem saber como se sentia, sorriu observando a foto. Era um quarto de hospital, não qualquer hospital, um particular julgando pela estrutura. Na cama, uma jovem mulher loira sorridente vestia a típica camisola branca, estava coberta com uma manta cor de rosa e nos braços, havia um pacotinho envolto por uma manta de cor amarela com flores cor de rosa. Era ela quando bebê! Só podia ser. “Dianna e Demi – 20 de Agosto de 1992”. Estava escrito atrás da foto, e aquela letra pertencia Amélia.

Na segunda fotografia um pouco gasta, Dianna estava tão sorridente quanto na primeira. Estava sentada de pernas esticadas a cama, e nos braços estava o bebê um pouco maior e saudável mamando no seio. “Eu e a minha pequenina com quatro meses. Amo você Demi! – 10 de Dezembro de 1992”. O que sentir? O coração bateu rápido que Demi pode ouvi-lo. Será que era verdade? A tinha azul da caneta no verso do papel estava gasta, não tinha como ter sido algo forjado apenas para comove-la.

A terceira fotografia arrancou lágrimas e soluços de Demi. O coração partiu-se em milhares de pedaços quando ela viu a fotografia. Sobre a mesma mesa que estava na cozinha de Dianna, estava um bolo simples e confeitado de chantili branco e cor de rosa. No centro estava uma velinha no formato do número um. Dianna estava bonita, vestia roupas joviais, sorria feliz e nos braços estava o bebê tão feliz quanto a mãe. O cabelo escuro era diferente do da mãe e o da avó, as bochechas eram cheinhas e rosadas. Ao lado de Dianna estava Amélia também sorrindo e abraçando a filha e a neta. Era o que mais partia o coração de Demi. Ela realmente amava aquela mulher, aliás, amava as duas de todo o coração e se sentia quebrada. Ela sempre disse a Selena que nunca teve uma festa de aniversário, mas lá estava a prova viva. Não tinha como ela saber, tinha? Talvez se perguntasse a Dianna.. Só que era difícil a ponto de ser desgastante e enjoativo. “O primeiro ano da minha princesa. Hoje ela disse mamãe – 20 de Agosto de 1993”.
Dianna não podia fazer aquilo com ela. Não depois de tudo. Era um golpe covarde e não explicava tudo que aconteceu no decorrer dos vinte e três anos. Era apenas uma chantagem emocional. Demi sabia que era e no papel dobrado deveria estar a bomba para ela desarmar. A raiva se misturou a frustração, a culpa, ao auto-desprezo e aos outros sentimentos que a consumiam. O papel quase foi rasgado no ato brusco que foi puxado para fora do envelope, e quando foi aberto, Demi teve que limpar as lágrimas na manga da blusa de frio para começar a ler.

“Como eu posso começar? Eu não sei o que está passando na sua cabeça e eu não sei o que você pensa ao meu respeito, só tenho certeza que não é algo bom... Demetria. Dem, provavelmente quando você começar a ler essa carta, estarei dentro de um avião em destino ao Reino Unido. Passei três meses pensando em como eu poderia terminar os meus dias. Não quero mais deitar com homens em troca de dinheiro. Não quero mais ser sozinha. Não quero mais magoar a única pessoa nesse mundo que eu amo. Talvez em um lugar novo, eu encontre paz e uma nova chance para recomeçar. Você não leu errado, filha. Eu sempre te amei, amo você desde o dia que a vi indefesa e delicada na maternidade. Gostaria de contar tudo a você olhando em seus olhos e segurando a sua mão, mas não sei se eu suportaria. Então através dessa carta, contarei tudo, não com o objetivo de conseguir o seu perdão, porque isso eu sei que jamais vou merecer, só quero que você entenda um pouquinho a forma desumana que te tratei durante todos esses anos.

Ser uma garota não é fácil, filha. Você sabe disso, já passou por tantas coisas terríveis. Eu tinha apenas quatorze anos quando começou acontecer. A sua avó sempre foi uma mulher de palavras fortes, era gananciosa e nada estava bom. Nunca conheci o meu pai, e eu sequer sei o nome dele. Nós recebíamos dinheiro dele o suficiente para viver uma vida boa e luxuosa no centro de Nova York. Lembro-me que na época, eu sempre tinha que estar impecável nos meus vestidos de chiffon, a mamãe não perdoava um fio de cabelo fora do lugar. Quando saíamos, havia um carro nos esperando e eu sempre ficava sentada sem ousar em curvar a coluna observando as meninas da minha idade brincarem de boneca nas calçadas da rua. Eu tinha que interagir com adultos, ter uma conversa boa e educada para envolver os homens mais velhos.. A mamãe costumava sair com eles, e eu tinha que espera-la no lado de fora do quarto. Nós só soubemos que o meu pai faleceu quando o dinheiro parou de chegar. As contas começaram a chegar, sustentar o luxo era uma tarefa difícil. Eu já estava grande e começando a ficar arrogante e exigente como a mamãe. Foi exatamente quando eu tinha quatorze anos. A saída que a sua vó encontrou foi se prostituir. Ela já o fazia antes, apenas por diversão, mas depois foi o que conseguiu para nos sustentar. Não posso culpa-la. Ela era uma mulher sozinha, sem estudos, não sabia nem como pregar um botão, e com uma filha adolescente para criar e sustentar em plena década onde as mulheres não tinham vez. É absurdo, eu sei, porém é como as coisas acontecem. Minha virgindade custou quinhentos dólares, hoje não vale nada, mas na época foi o dinheiro que pagou o aluguel, a água, a energia, o gás e a comida que tínhamos na mesa. Eu não fiquei nenhum pouco feliz. Eu tinha planos de ir a faculdade como você, e antes de acontecer, eu queria material para continuar desenhando os meus croquis bobos que nunca evoluíram, com o dinheiro que sobrou, a mamãe comprou o material e a tristeza passou um pouco.. Não foi a primeira noite, acredite, é nojento e repugnante como os homens ficam empolgados com a imagem de uma menina nua seguindo todas as ordens deles... Eu consegui um bom dinheiro e nossa vida de luxo voltou aos poucos. A mamãe também tinha as formas de colocar comida na mesa. Enfrentar esse tipo de situação foi doloroso, cruel e custou a minha inocência, os meus sonhos e o resto da minha esperança, mas era o que nós tínhamos para sobreviver. Eu nem acreditava mais no amor e muito menos estava triste por ser uma prostituta de luxo. Foram três anos se deitando com homens diferentes, alguns eram clientes fiéis e pagavam boladas de dinheiro. O vício no luxo me prendeu a essa vida e me possuiu.

Quando completei dezessete anos, a mamãe precisou viajar para chácara do seu avô paterno... Não era para negócios... Se tratava de algo pessoal que ela nunca me contou – nós até discutimos por isso -, eu só sei que quando chegamos ao lugar, eu o vi. Ele era o garoto mais bonito e diferente que eu já tinha visto até então. Esse não foi o maior problema, eu já estava acostumada com homens bonitos e eu podia tê-los e ainda receber por isso. O problema foi como eu me senti. Foi anormal, eu já tinha lido a respeito e visto em filmes, eu não podia estar apaixonada. Repeti baixinho comigo mesma por horas “deixa de ser boba, você não está apaixonada”. Nos hospedamos na chácara e era obrigação cumprimentar a todos, se eu não o fizesse, certamente apanharia ali mesmo...  Lembro-me perfeitamente de tudo. Da arrumação da cozinha, de como o céu estava com um azul claro bonito naquela tarde e de quando o seu pai chegou na cozinha. Ele era muito alto e corpudo para idade, claro que não chega nem aos pés de como ele é grande hoje... digo, em porte físico... em músculos. A camisa que ele vestia era xadrez preta com um vermelho sangue vibrante. A calça jeans era grossa e escura, ficava tão bem no quadril dele. E você tem a péssima mania de querer usar all star em todos lugares que vai por culpa do seu pai. Ele também usava um par desse maldito tênis, e estava um pouco sujo. Não tinha muita barba no rosto, apenas alguns fios escuros no queixo, aos arredores dos lábios e eram falhos abaixo nas bochechas. Nada comparado ao que é hoje.. O cabelo é da mesma cor que o seu, marrom e liso. Os olhos e o branco rosado da pele também. Eu não consegui tirar os olhos dele, e nem ele de mim. Quando os adultos se envolveram na conversa, eu fiquei ao lado da mamãe tensa porque o seu pai não parava de me olhar e comentar com o seu tio David. Era óbvio que eles estavam falando de mim. Me senti desconfortável, nervosa e perdida. Pedi licença e ele me abordou no corredor. Trocamos um oi tão estranho, havia mais uma tensão sexual e emocional do que nós mesmos, apresentei-me novamente e ele também, trocamos um aperto de mãos e eu dei um jeito de entrar no quarto antes que a situação ficasse mais estranha. Passei o resto do dia pensando nele, tentei criar um croqui novo para tentar me distrair, mas acabei desenhando o rosto dele. O que posso te contar é que foi a primeira vez que me senti amada e com esperança de ter uma vida de verdade. Dentro de dois dias, eu e o seu pai não conseguíamos manter a distância, estávamos nos beijando em todas as oportunidades que tínhamos e correndo pela chácara como eu nunca tinha feito. Me senti amada, jovem e tão feliz a ponto de não parar de sorrir. Sorte era que a mamãe estava envolvida demais para me corrigir e repreender, mas ela estava ciente do que estava acontecendo, acho que só me deixou viver o meu romance porque sentia culpa por tudo que tinha me feito passar quando mais nova.

Foram semanas namorando, passamos até dois dias sumidos... Tudo estava ficando muito intenso e nós dois apaixonados. Marcamos um piquenique noturno. O seu pai me mostrou as músicas da época, e ficou tão surpresa por eu não conhecer Bon Jovi, Guns ou A-ha. Eu não tive coragem de contar para ele quem eu realmente era, como vivia em Nova York, estragaria tudo. Nós fizemos amor sobre as estrelas... acho que posso me referir assim ao que aconteceu, e você já é grande para saber. E como sempre acontecia, ele me abraçava e começava a falar de coisas que até então eu não conhecia. Estava tudo perfeito, até que eu vi o seu avô nos olhando. Senti medo, mas não tive coragem de contar. No dia seguinte eu estava animada para encontrar o seu pai novamente, eu era muito nova e por mais que já tivesse me deitado com muitos homens, não significava que tinha maturidade o suficiente para arcar com certas situações, mas tudo aconteceu de uma hora para outra. Comecei a sentir enjoos e a mamãe suspeitou que eu poderia estar grávida, compramos um caro teste de gravidez e o resultado foi positivo. Eu iria contar no dia seguinte para o seu pai, e estava até feliz porque eu sabia que estava esperando uma criança dele, do homem que eu amava. Quando acordei, o boato que ele seria pai de gêmeas estava na boca de todos, ele tinha engravidado uma garota antes de me conhecer, eles não eram comprometidos. Fiquei confusa e assustada, a minha mãe não estava por perto naquela manhã, só me lembro que quando acordei, procurei um rosto familiar por toda casa, não encontrei ninguém, me preparei para voltar para o quarto porque estava enjoada e antes de entrar, o seu avô me abordou sem nenhuma gentileza, ele me arrastou para dentro do quarto pelo abraço, falou que sabia que eu estava grávida de uma criança do filho dele e que não permitiria que o futuro do seu pai ao lado de uma moça de boa família fosse estragado. Ele me violentou no banheiro do quarto e depois me expulsou da chácara com a sua avó. Naquele dia eu acordei animada e com a esperança de ser feliz junto com o homem que eu amava e o fruto do nosso amor, mas quando a noite terminou, a garota feliz que eu tinha construído naqueles dias morreu junto com a que adorava desenhar croquis e até a que estava começando a se divertir com os homens por dinheiro. Passei noites sem conseguir dormir, sem comer, sem tomar banho. Mal piscava os olhos. Não era como se eu já não tivesse sido violentada. No dia que a sua avó me vendeu, doeu fisicamente e emocionalmente. Porém quando fui destruída pela primeira vez, eu não tinha sonhos como os que eu tinha criado com o seu pai, eu não tinha você no meu ventre. Não foi agressivo, sujo e brusco. Quando Peter me estuprou no chão sujo daquele banheiro, ele destruiu as minhas novas esperanças, destruiu os sonhos que o seu pai me fez acreditar, destruiu a minha felicidade, ele destruiu a minha capacidade de amar, de querer viver, de querer.. Ele acabou com o que eu tinha de mais precioso. Doeu. Como doeu. A dor era como um buraco que jamais poderia ser preenchido, nada conseguia me satisfazer. Os meses passaram, a minha barriga começou a crescer e eu continuei no mesmo estado vegetativo: dormindo e mal comendo. Quando você nasceu e eu, desanimada, vi o seu rosto, você me fez sorrir. Foi o primeiro sorriso dentro de nove meses. Não sei se foi felicidade, ou o que.. Só foi bom ter você, Demi. Se não fosse você, certamente eu não estaria viva. Eu teria acabado com isso... Nós duas ficamos juntas e inseparáveis por meses, eu estava começando a me recuperar. Porém a vida não é um conto de fadas, filha. Ter um bebê dentro de casa exigia uma série de cuidados, boa alimentação para a mãe e a criança, roupas, fraldas, e tantas outras coisas. A mamãe continuava se prostituindo porque era a única forma de ela conseguir colocar comida na mesa. Quando você completou um ano e dois meses, o meu corpo estava melhor e mais adulto. Como eu disse, a sua avó era uma mulher gananciosa e o fato dela estar dando conta das coisas sozinha era um absurdo para ela. Nós discutimos e ela me ameaçou, disse: se você não começar a ajudar dentro de casa, eu vou levar essa menina para adoção. O que eu poderia fazer? Tinha apenas dezoito anos, estavam sobre a responsabilidade dela, eu e você. Fiquei tão revoltada, mas voltei... Me envolvi com homens perigosos, nos programas às vezes eu usava drogas. Foi assim por anos e anos. Eu não queria viver aquela vida podre, eu não queria que a minha filha fosse criada com aquele dinheiro sujo, eu não queria ter que passar por aquela situação. A revolta só crescia dentro de mim, e a saída ficava cada vez mais estreita. Quando percebi que não teria jeito, foi onde mergulhei de cabeça na prostituição, eu não tinha mais nada a perder. Foi uma revolta e ódio sem tamanho, eu não estava mais me importando, fiquei fora de mim por anos, descontei em você toda a minha frustração. A situação só melhorava quando eu conseguia alimentar os meus vícios e descontar em você. Não tem justificativa, você jamais mereceu o que eu fiz. Eu gostaria de poder dizer que eu te amo em bom e alto som, mas ainda dói tanto. Não sei se algum dia essa dor vai passar, eu concordei comigo mesma que não continuaria te maltratando, te traindo e enganando. Eu sempre vou te amar, Demi. Sempre te amei, só não fui capaz de dizer quando ainda tinha tempo. Quero que você não tenha medo, que continue sendo essa mulher forte e sonhadora. Não deixe ninguém nesse mundo te machucar como eu fiz, como o Peter fez com nós duas. Sempre sorria, nunca pare de sonhar e nem de lutar para tornar os seus sonhos realidade. Seja feliz ao lado dos seus amigos, não abandone a Selena, eu sempre tive inveja de todo o carinho e amor que ela tem por você. Não deixe o Joseph, é tão lindo e puro o amor de vocês. Deixe que ele te faça feliz e o faça feliz. Viva intensamente porque o tempo não volta. Eu quero uma casa cheia de netinhos e netinhas. Nunca vou conhecê-los, mas eu gostaria que você tivesse uma família grande e que um transborde amor um pelo outro. Não tenho direito de te pedir nada, mas eu quero muito, de toda a minha alma, que você seja feliz.

Com o mais puro e verdadeiro amor, mamãe. Você é a melhor coisa que eu já fiz por esse mundo! Eu te amo infinitamente, meu amor. – Dianna.”


Continua... Ok, ok. Eu não sei vocês, mas eu estou em lágrimas. Sabe porque eu estou triste? Porque sei que, infelizmente, a realidade da Dianna é a de muitas mulheres por esse mundo. Não é todo mundo que tem a oportunidade de ter pais amorosos, de ter direito ao estudo, educação e tudo que nós temos e às vezes consideramos pouco.. É uma história triste, porém verdadeira. É difícil de entender, muito difícil relacionar as coisas, mas por trás de pessoas que rudes, os "vilões", pode ter uma história tão cruel quanto a da Dianna. Claro que não justifica nada que a Demi passou, só ajuda a entender um pouquinho as atitudes da personagem. Comecei a escrever esse capítulo descrente e um pouquinho desinteressada, por isso demorou, mas conforme o montei, fiquei animada e finalmente saiu. Gostei muito do capítulo e espero que vocês também. Era para acontecer mais coisas, mas estava ficando muito grande e eu tinha que parar porque ficaria cansativo para ler, acho que a carta da Dianna ficou... Então é isso. Perdoem a demora e a falta de atenção, eu estava naquele mesmo e velho sistema cansativo de provas e trabalhos, ontem não teve aula - sim, eu estudo no sábado -, então descansei e hoje ficou mais tranquilo para escrever. Obrigada por todos os comentários e visualizações, obrigada mesmo!!! Comentem a opinião de vocês. Um abraço beeeem apertado <3